FRASES CÉLEBRES

Frases Célebres

"Ama-me quando eu menos o merecer, porque será nessa altura que mais necessitarei"
-- Dr.JeckyII


"Sê paciente, espera que a palavra amadureça e se desprenda como um fruto ao passar o vento que o mereça"
-- Eugénio De Andrade


"O amor e a verdade estão unidos entre si, como as faces de uma moeda. É impossível separá-los. São as forças mais abstractas e mais poderosas desse mundo."
-- Mahatma Gandhi


"Há vários motivos para não se amar uma pessoa e um só para amá-la."
-- Carlos Drummond de Andrade


"Todas as cartas de amor são ridículas. Não seriam cartas de amor se não fossem ridículas. Também escrevi em meu tempo cartas de amor. Como as outras, ridículas..."
-- Fernando Pessoa


"O verdadeiro amor é como os fantasmas. Todos falam nele, mas ainda ninguém o viu."
-- Fide da Roche


"O amor e o desejo são as asas do espírito das grandes façanhas."
-- Johann Wolfgang von Goethe


"O amor é a força mais subtil do mundo."
-- Mahatma Gandhi


"Amar é encontrar na felicidade de outrem a própria felicidade."
-- Gottfried Leibnitz


"Amar não é aceitar tudo. Aliás: onde tudo é aceito, desconfio que há falta de amor."
-- Vladimir Maiakovski


"Foi o tempo que dedicaste à tua rosa que fez tua rosa tão importante."
-- Antoine de St. Exupery (in "O princepezinho")


"Os homens cultivam cinco mil rosas num mesmo jardim e não encontram o que procuram. E, no entanto, o que eles buscam poderia
ser achado numa só rosa."
-- Antoine de St. Exupery


"Sou o dono dos tesouros perdidos no fundo do mar.
Só o que está perdido é nosso para sempre.
Nós só amamos os amigos mortos
E só as amadas mortas amam eternamente..."
-- Mário Quintana


"Tudo o que sabemos do amor, é que o amor é tudo que existe."
-- Emily Dickinson


"Amor são duas solidões protegendo-se uma à outra."
-- Rainer Maria Rilke


"O amor é a asa veloz que Deus deu à alma para que ela voe até o céu."
-- Michelangelo Buonarroti


"Temer o amor é temer a vida e os que temem a vida já estão meio mortos."
-- Bertrand Russell


"Para fazer uma obra de arte não basta ter talento, não basta ter força, é preciso também viver um grande amor."
-- Wolfgang Amadeus Mozart


"Não há nada que esteja só; nada pode estar em completa solidão: o que existe necessita de outro para ser."
-- Leopoldo Schfer


"A pior solidão que existe é darmo-nos conta de que as pessoas são idiotas."
-- Gonzalo Torrente Ballester


"Quando o amor vos fizer sinal, segui-o; ainda que os seus caminhos sejam duros e escarpados. E quando as suas asas vos envolverem, entregai-vos; ainda que a espada escondida na sua plumagem vos possa ferir."
-- Khali Gibran


"Só se vê com o coração. O Essencial é invisível aos olhos"
-- Exupéry


"Nada existe de grandioso sem Paixão"
-- Hegel


"O beijo é a menor distância entre dois apaixonados"
-- Amy Banglin


"O falar incessantemente por hipérboles só se adapta bem ao amor."
-- F. Bacon


"É preciso sofrer depois de ter sofrido, e amar, e mais amar, depois de ter amado"
-- Guimarães Rosa


"Na terra nasce o amor, no céu floresce."
-- Maciel Monteiro


"Ninguém pode fugir ao amor e à morte"
-- Públio Siro


"O amor é uma flor delicada, mas é preciso ter a coragem de ir colhê-la à beira de um precipício aterrador."
-- Storm (João Teodoro Woldsen)


"Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas"
-- Saint-Exupèry


"Conservar algo que possa recordar-te seria admitir que eu pudesse esquecer-te"
-- Shakespeare


"Amar é admirar com o coração. Admirar é amar com o cérebro."
-- Theophile Gautier


"O amor grava sua tatuagem na carteira de todo amante"
-- Mildred Meiers


"A religião prestou ao amor um grande serviço, fazendo dele um pecado."
-- Anatole France


"Nunca devemos julgar as pessoas que amamos. O amor que não é cego, não é amor."
-- Honore de Balzac


"O amor é um conflito entre nossos reflexos e nossas reflexões."
-- Magnus Hirschfeld


"Pode-se amar até a loucura uma mulher feia, por encantos que superam os encantos da beleza."
-- Jan Paulhan


"Na vida do homem, o amor é uma coisa a parte, na da mulher, é toda a vida."
-- Lord Byron


"Não sou como a abelha saqueadora que vai sugar o mel de uma flor, e depois de outra flor. Sou como o negro escaravelho que se enclausura no seio de uma única rosa e vive nela até que ela feche as pétalas sobre ele; e abafado neste aperto supremo, morre entre os braços da flor que elegeu."
-- Roger Martin du Gard, Os Thibault


"O amor não é mais que uma amizade inflamada"
- Pintor de Évora


"Quem começa a entender o amor, a explicá-lo, a qualificá-lo e quantificá-lo, já não está amando."
-- Roberto Freire


"As pessoas entram em nossa vida por acaso, mas não é por acaso que elas permanecem."
-- Lilian Tonet


"Só há amor quando não existe nenhuma autoridade."
-- Raul Seixas


"Um sonho sonhado sozinho é um sonho. Um sonho sonhado junto é realidade."
-- Raul Seixas


"Não exijas dos outros qualidades que ainda não possuem."
-- Francisco Cândido Xavier


"Não somos amados por sermos bons. Somos bons porque somos amados."
-- Desmond Tutu


"Num bom relacionamento, a proporção de poder entre o homem e a mulher deve ser um a um."
-- Elizabeth Hurley


"O erotismo é o grande triângulo entre o homem, a mulher e Deus."
-- Olga Savary


"As almas encontram-se nos lábios dos enamorados."
-- Percy Bysshe Shelley


"Onde o amor impera, não há desejo de poder; e onde o poder predomina, há falta de amor. Um é a sombra do outro."
-- Carl Gustav Jung


"A fotografia nunca se revela por inteiro quando você se desmancha por alguém. Essas relações lembram uma foto polaroid: a imagem vai aparecendo aos poucos. Algumas coisas se distanciam do sentimento original, mas isso é a vida."
-- Mia Farrow


"É mais fácil ser amante do que marido, pois é mais fácil dizer coisas bonitas de vez em quando do que ser espirituoso dias e anos a fio."
-- Honoré de Balzac


"Sabe o que é melhor que ser bandalho ou galinha? Amar. O amor é a verdadeira sacanagem."
-- Tom Jobim


"Amar é... ser a primeira a reconhecer o corpo dele no Instituto Médico Legal."
-- Ivan Lessa


"Não se ama duas vezes a mesma mulher."
-- Macahado de Assis


"Você pode amar muito uma pessoa e ir para a cama com outra."
-- Leila Diniz


"Lembre-se!!! Quando pensar em ferir alguém, lembre-se que você pode está dentro do coração desse alguém."
-- Ana Paula Nascimento Ramos


"Amor é um não-sei-quê, que surge não sei de onde, e acaba não sei como."
-- Scudery


"Assim como as chaves abrem cofres, as cartas abrem corações."
-- James Howell


"Aqueles que amamos nunca morrem, apenas partem antes de nós."
-- Amado Nervo


"Nunca lamente uma ilusão perdida, pois não haveria fruto se a flor não caísse ".
-- Thaysa M. Dutra


"Quem tentar possuir uma flor, verá sua beleza murchando. Mas quem apenas olhar uma flor num campo, permanecerá para sempre com ela. Você nunca será minha e por isso terei você para sempre."
-- Paulo Coelho


"O amor não se constitui de cegueira, se constitui em ver os defeitos do amado e aceita-los apenas porque se ama."
- Lucas Augusto


"O amor é grande e cabe nesta janela sobre o mar. O mar é grande e cabe na cama e no colchão de amar. O amor é grande e cabe no breve espaço de beijar."
-- Carlos Drummond de Andrade


"Quando fala o amor, a voz de todos os deuses deixa o céu embriagado de harmonia."
-- William Shakespeare


"Lutar pelo amor é bom, mas alcançá-lo sem luta é melhor"
-- William Shakespeare


"Um coração feliz é o resultado inevitável de um coração ardente de amor"
-- Madre Teresa


"O amor é o nosso estado natural quando não optamos pela dor, pelo medo ou pela culpa"
-- Willis Harman e Howard Rheingold


"Como se tornar uma esposa melhor? Tentando não fazer do marido um esposo melhor."
-- Gurumayi Chidvilasananda


"Saia da roda do tempo e venha para a roda do amor."
-- Jalaludin Rumi


"Nenhum homem viveu que tivesse suficiente / Gratidão de crianças e amor de mulher."
-- William Butler Yeats


"No homem, o desejo gera o amor. Na mulher, o amor gera o desejo."
-- Jonathan Swift


"O amor é como fogo: para que dure é preciso alimentá-lo."
-- La Rochefoucauld


"O verdadeiro amor nunca se desgasta. Quanto mais se dá mais se tem."
-- Saint-Exupèry


"Um amor mais forte que tudo, mais obstinado que tudo, mais duradouro que tudo, é somente o amor de mãe."
-- Paul Raynal


"Amor não se conjuga no passado; ou se ama para sempre, ou nunca se amou verdadeiramente."
-- M. Paglia


"Para fazer uma obra de arte não basta ter talento, não basta ter força, é preciso também viver um grande amor".
-- Wolfgang Amadeus Mozart


"Amar alguém é ser o único a ver um milagre invisível aos outros."
-- Mauriac



"O amor nasce do desejo respeitoso de fazer eterno o passageiro"
-- Ramón Gómez de la Serna



Lutar pelo amor é bom, mas alcança-lo sem luta é melhor.
-- William Shakespeare


Amar é mudar a alma de casa.
-- Mario Quintana


Amar, porque nada melhor para a saúde que um amor correspondido.
-- Vinícius de Moraes


No homem, o desejo gera o amor. Na mulher, o amor gera o desejo.
-- Jonathan Swift


Um coração feliz é o resultado inevitável de um coração ardente de amor.
-- Madre Teresa


O amor é o nosso estado natural quando não optamos pela dor, pelo medo ou pela culpa.
-- Willis Harman e Howard Rheingold


Haverá algo mais belo do que ter alguém com quem possa falar de todas as suas coisas como se falasse consigo mesmo?
-- Cícero


O amor decresce quando cessa de crescer.
-- Chateaubriand


Não há surpresa mais maravilhosa do que a surpresa de ser amado.
-- Charles Morgan


Há cordas no coração humano que o melhor seria não fazê-las vibrar.
-- Charles Dickens


O tempo pode extinguir ligeira chama, mas não os vulcões.
-- Castilho


O amor não é inteiramente um delírio, mas tem com ele muitos pontos em comum.
-- Carlyle


O amor sendo cego, os enamorados não podem ver as loucuras que
cometem.
-- Shakespeare


Quando alguém está apaixonado, começa por enganar-se a si mesmo e acaba por enganar os outros. É o que o mundo chama romance.
-- Oscar Wilde


O amor é um sórdido embuste pelo qual a natureza nos leva a
continuar a espécie.
-- W. Somerser Maugham


Quem ama muito fala pouco.
-- B. Castiglione


O amor é o único jogo no qual dois podem jogar e ambos ganharem.
-- Erma Freesman


Na raiz de quase todas as misérias materiais e, sobretudo, morais, está uma falta de amor, uma fome de afeição que não foi satisfeita.
-- Georges Arnold


Uma vida sem amor é como árvores sem flores e sem frutos.
E um amor sem beleza é como floressem perfume.
Vida, amor, beleza: eis a minha trindade.
-- Gibran, Temporais


O fundo de uma agulha é bastante espaçoso para dois enamorados;
mas o mundo todo é pequeno para dois inimigos.
--Solomon Ibn Gabirol


Gostamos de alguém porque; amamos alguém apesar de.
--Henri de Montherland

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terça-feira, 28 de agosto de 2012

WWF Brasil - Descaso com nascentes e rios ameaça o Pantanal






E D I T O R I A L
Caros amigos,
O day after da Rio+20 mostrou que nem tudo está perdido. Afinal,

se
as expectativas no tocante às negociações no restrito âmbito da

governança
global não eram – e realmente não foram – animadoras,
houve relevantes avanços no tratamento da questão da

sustentabilidade
ambiental e econômica planetária, como aponta a coleção de

artigos
que abrem esta edição Pós-Rio+20.
No primeiro texto, José Eustáquio Diniz Alves aponta as mais

significativas
conquistas, retrocessos e paralisias embutidas nos 283 parágrafos

do documento
final oficial da Conferência. Essa primeira leitura revela que,

mesmo
não se tendo conseguido avanços espetaculares, já se pode notar

seguros
indícios de mudanças na pauta de reivindicações necessárias para

prevenir
o anunciado colapso da humanidade e da biodiversidade.
Muito da frustração ressentida no pós-Rio+20 deveu-se ao fato de

os
chefes de Estado presentes à cúpula – e seus ministros e delegados


recorrerem ao surrado álibi crise internacional (entre outros) para

postergar
a implantação-já de ações e decisões políticas sobre a verdadeira

crise
– a ambiental. Mas será que podiam ter agido de forma diferente

no
atual quadro de pensamento desenvolvimentista-consumista? Esse

é o
nó da questão: a mudança de paradigma do modelo econômico.
Mas a “cruzada” por um novo pensar-viver-sustentável progride e

ganha a
cada segundo mais adeptos por força da sociedade civil – os Major
Groups – ,que na Rio+20 juntaram suas força de pressão em áreas

temáticas:
Negócios e Indústria / Crianças e Jovens / Agricultores / Povos
Nativos / Autoridades Locais / ONGs / Comunidade Científica e
Tecnológica / Mulheres / Trabalhadores e Sindicatos. Em

sintonia, todos
trabalharam intensamente estimulando reflexões e gerando

trabalhos
técnicos de suporte, que poderiam ter orientado as decisões das

delegações,
como aponta Henrique Cortez em artigo aqui publicado.
De qualquer forma, esse brainstorm parido coletivamente pelos

Major
Groups continua vivo, em evolução e reivindicando em voz alta,

nas
instâncias da governança global e nas esferas do todo poderoso

“mercado”,
as mudanças estruturais emergenciais e futuras. Esse é nosso
trabalho e objetivo: acelerar sem bruscas rupturas a transição

para
uma nova era de produção e consumo consciente, e respeitosa ao
meio ambiente, como indicam as outras reflexões desta edição.
Helio Carneiro
Editor





A Conferência das Nações Unidas sobre
Desenvolvimento Sustentável não esteve
à altura das necessidades do momento histórico.
Mas tentando superar o pessimismo,
pode-se considerar que a Rio+20 teve,
numa conjuntura internacional desfavorável,
pelo menos dois pontos positivos:

a) Mostrou os impasses para se regular o Bem
Comum – chamado Terra – e as dificuldades
que a ONU e os governos nacionais encontram
para mudar o rumo que a civilização humana
tomou em direção ao colapso ambiental; e
por José Eustáquio Diniz Alves
Este artigo avalia alguns dos pontos positivos e fracos, e as

principais
lacunas dos 283 parágrafos do documento final oficial da Rio+20.
Documento inócuo,
platitudes ou
pequeno passo?

b) Reafirmou os mais importantes princípios
das Conferências anteriores e manifestou,
de maneira parcial e de forma tímida,
intenções de mudar o modelo atual de produção
e consumo insustentáveis. A Rio +
20 não foi um ponto de chegada, e, quem
sabe, ao invés de simples procrastinação
pode se tornar um ponto de partida.
Evidentemente, as propostas discutidas na
Cúpula dos Povos ficaram de fora do documento
oficial “O futuro que queremos” e falta
definir vários meios de implementação dos
princípios reafirmados e renovados. Ninguém
esperava uma Conferência revolucionária
que virasse o mundo de cabeça para baixo.
Entendendo os limites deste tipo de evento,
existe consenso de que faltou ousadia, embora,
com boa vontade, possa se dizer que a
Rio+20 não apresentou retrocesso em relação
às conferências anteriores e o documento
final, mesmo tímido, é melhor do que o
Zero Draft de janeiro de 2012.
Sem dúvida, com as promessas adiadas, o
mundo está no começo de uma longa jornada, pois muito terá que

ser feito pelos governos,
pela sociedade civil e pelos indivíduos
nos próximos anos e nas décadas vindouras.

Se a Conferência não foi o teto, quem sabe
possa ser utilizada como a base para futuros
avanços. Vamos então avaliar brevemente alguns
pontos positivos, alguns pontos fracos
e as principais lacunas dos 283 parágrafos do
documento oficial da Rio + 20.

NO PRIMEIRO PARÁGRAFO DA INTRODUÇÃO, OS
CHEFES DE ESTADO E DE GOVERNO RENOVAM O
COMPROMISSO COM O DESENVOLVIMENTO

SUSTENTÁVEL,
ENTENDIDO COMO A PROMOÇÃO DA
SUSTENTABILIDADE ECONÔMICA, SOCIAL E AMBIENTAL
QUE GARANTA A SAÚDE DO PLANETA E
DAS GERAÇÕES HUMANAS, PRESENTES E FUTURAS.
Com destaque, no segundo parágrafo
estabelece que: “Erradicar a pobreza é o
maior desafio global que o mundo enfrenta
hoje, sendo um requisito indispensável para
o desenvolvimento sustentável. Neste sentido
estamos comprometidos com a humanidade
livre da pobreza e da fome como uma
questão de urgência”.

Comentário: Obviamente, erradicar a pobreza
e a fome é fundamental. Em negociações
subsequentes será preciso definir quais são
os indicadores de pobreza e quais serão as
medidas para erradicar estas chagas. Eliminar
os gastos militares no mundo, da ordem de
US$1,6 trilhão de dólares ao ano, seria suficiente
para erradicar a pobreza e a fome em pouco
tempo. Porém, esta medida jamais entraria
num documento da ONU assinado pelos diversos
governos nacionais do mundo.

O PARÁGRAFO 6 REAFIRMA O PRINCÍPIO DA RIO92:

“RECONHECEMOS QUE AS PESSOAS ESTÃO NO
CENTRO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL”.

Comentário: Esta afirmação é uma reprodução
do que foi decidido em diversas outras
Conferências, mas é muito antropocêntrica,
pois o desenvolvimento só será realmente
ambientalmente sustentável se for
ecocêntrico, garantindo o futuro sustentável
não só dos seres humanos, mas de todas
as espécies vivas. Aliás, o documento
não tocou na questão dos direitos dos animais
e da luta contra o especismo.

O PARÁGRAFO 8 DIZ: “REAFIRMAMOS TAMBÉM A
IMPORTÂNCIA DA LIBERDADE, DA PAZ E SEGURANÇA,
O RESPEITO PELOS DIREITOS HUMANOS,
INCLUINDO O DIREITO AO DESENVOLVIMENTO E
O DIREITO A UM PADRÃO DE VIDA ADEQUADO,
INCLUINDO O DIREITO À ALIMENTAÇÃO, AO ESTADO
DE DIREITO, À IGUALDADE DE GÊNERO E O
EMPODERAMENTO DAS MULHERES”.

Comentário: Direitos humanos e democracia
são questões básicas e essenciais. Mas
é preciso questionar a idéia do “direito ao
desenvolvimento”, especialmente se desenvolvimento
for entendido como crescimento
econômico ilimitado. Existem várias idéias
alternativas que não foram consideradas,
tais como “Estado Estacionário”, “Prosperidade
sem crescimento”, “Fim do crescimento”,
“Decrescimento sustentável”, etc.

NO TÓPICO II – RENOVAÇÃO DO COMPROMISSO
POLÍTICO – O ITEM A, TRATA DA REAFIRMAÇÃO
DO PRINCÍPIOS DA CÚPULA DO RIO DE 1992 E
OS PLANOS DE AÇÃO DO PASSADO:

 Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre o
Ambiente Humano de Estocolmo aprovada
em 16 de junho de 1972;
 Declaração do Rio
sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento
de 1992,
 Agenda 21, o Programa para a Implementação
da Agenda 21, o Plano de Implementação
da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento
Sustentável (Declaração de
Joanesburgo),

 o Programa de Ação de Barbados,
Convenção Quadro das Nações
Unidas sobre Mudança do Clima
(UNFCCC), Convenção sobre Diversidade
Biológica (CDB) e Convenção de Combate
à Desertificação (UNCCD), etc. Incluiu também
o princípio das “responsabilidades
comuns mas diferenciadas”.

Comentário: Reafirmar todos os princípios
e Declarações já consolidadas é fundamental.
O princípio das responsabilidades comuns
mas diferenciadas é essencial pois os
países desenvolvidos possuem uma dívida
histórica com o meio ambiente e com os
demais países do mundo. Mas faltou definir
a transferência de recursos dos países
do “Norte” para ajudar os países do “Sul”,
para evitar a repetição dos mesmos erros
do passado. Mas quando se trata de dinheiro
o desacordo é enorme porque, no
geral, os países ricos querem regatear recursos
e prorrogar a transferência de fundos
financeiros. Não foram definidas as
ações concretas para acelerar a implementação
dos compromissos já assumidos.

O ITEM B, PARÁGRAFO 19 RECONHECE QUE “OS
VINTE ANOS DESDE A CÚPULA DA TERRA EM 1992
REGISTRARAM UM PROGRESSO DESIGUAL NO

DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL E NA ERRADICAÇÃO
DA POBREZA, DEVIDO, ENTRE OUTRAS COISAS,
AO IMPACTO DAS CRISES MÚLTIPLAS QUE AFETAM
O MUNDO CONTEMPORÂNEO. O parágrafo
40 diz: “Apelamos para abordagens holísticas
e integradas para o desenvolvimento
sustentável que irá orientar a humanidade a
viver em harmonia com a natureza e fazer
esforços para restabelecer a saúde e a integridade
do ecossistema da Terra”.

Comentário: A atual crise econômica mundial
reduz os recursos financeiros para a
cooperação internacional e aumenta a competição
entre os países. Prometer uma abordagem
holística para garantir a integridade
dos ecossistemas é ótimo, mas sem recursos
financeiros se torna vazia.

O ITEM C TRATA DA FORMA DE ENVOLVER OS
PRINCIPAIS GRUPOS E OUTRAS PARTES INTERESSADAS
NA PROMOÇÃO DO DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL, TAIS COMO:
 os poderes legislativos regionais, nacionais e sub-nacional,
os judiciários e todos os principais grupos:
mulheres, crianças e jovens, povos indígenas,
organizações não-governamentais, autoridades
locais, trabalhadores e sindicatos,
empresas e indústria, a comunidade científica
e tecnológica, os agricultores, os
setores público e privado, etc.

Comentário: A ampla participação é fundamental
para o desenvolvimento sustentável,
mas existe uma grande assimetria entre
a participação governamental e a atuação
da sociedade civil. Como afirmou Wael
Hmaidan, da Climate Action Network International,
que discursou em nome do chamado
“major group”, o documento aprovado
pela diplomacia, intitulado O Futuro que
Queremos, está “totalmente fora de contato
com a realidade e exigimos que as palavras
‘com plena participação da sociedade civil’ sejam removidas do

texto”. Outras
ONGs (como Vitae Civilis e Idec) também
criticaram o processo de negociação
da ONU e pediram mais participação efetiva
da sociedade civil nas decisões.


Não haverá ganho
se a economia verde
for entendida como
uma forma de gerar
uma maquiagem verde
para manter
o atual modelo
insustentável de
crescimento da
produção e do
consumo conspícuo.



O TÓPICO III TRATA DA ECONOMIA VERDE NO
CONTEXTO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
E A ERRADICAÇÃO DA POBREZA, entendendo
que “existem diferentes abordagens, visões,
modelos e ferramentas disponíveis
para cada país, de acordo com suas circunstâncias
e prioridades nacionais, para alcançar
o desenvolvimento sustentável nas
suas três dimensões”. O parágrafo 60 diz:
“Reconhecemos que a economia verde no
contexto do desenvolvimento sustentável
e da erradicação da pobreza vai aumentar
nossa capacidade de gerir os recursos naturais
de forma sustentável e com menores
impactos ambientais negativos, além de
aumentar a eficiência dos recursos e reduzir
o lixo e o desperdício”.

Comentário: A questão da economia verde
é um dos temas mais polêmicos do documento.
Mas tanto desenvolvimento sustentável
como economia verde são termos que
podem ser capturados pelos interesses do
capitalismo. Evidentemente, existe grande
concordância na necessidade de construção
de uma sociedade de baixo carbono e
na superação do modelo de desenvolvimento
marron e poluidor. Retirar os cerca de um
trilhão de dólares de subsídios da indústria
fóssil seria um passo decisivo para a economia
verde. Mas não haverá nenhum ganho
se a economia verde for entendida como
uma forma de gerar uma maquiagem verde
para manter o atual modelo insustentável
de crescimento da produção e do consumo
conspícuo. Se fosse garantida energia limpa
e renovável para todos os habitantes do
mundo, com produção descentralizada e
geração de empregos decentes, já seria um
grande passo para a chamada economia
verde e inclusiva.

O TÓPICO IV TRATA DO QUADRO INSTITUCIONAL
PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL. O item
A, aborda o reforço das três dimensões do
desenvolvimento sustentável, adotando uma
abordagem de ação orientada para resultados,
levando em conta todos os relevantes
temas transversais. O item B, trata do reforço
dos acordos intergovernamentais, ressaltando
a necessidade de fortalecer todo o sistema
das Nações Unidas, destacando a criação
de um Fórum de alto nível político, para
acompanhar a implementação do desenvolvimento
sustentável, evitando a sobreposição
com as estruturas existentes.

Comentário: O reforço da capacidade da
ONU para regular o processo de desenvolvimento
sustentável possui muitas resistências
das forças capitalistas, assim como existe
enorme dificuldade para definir os recursos
para o financiamento. Na falta de compromisso
financeiro, o fórum de alto nível vem
para fortalecer o PNUMA, aumentando a
capacidade de gestão da ONU. Mas isto
depende da forma de implementação.

O TÓPICO V TRATA DO QUADRO DE AÇÃO E

SEGUIMENTO,ABORDANDO AS ÁREAS TEMÁTICAS E
QUESTÕES INTERSETORIAIS, tais como: Erradicação
da pobreza; Segurança alimentar e
nutricional e agricultura sustentável; Água
e saneamento; Energia; O turismo sustentável;
O transporte sustentável; Cidades
sustentáveis e assentamentos humanos;
Saúde e população; Promover o pleno emprego
produtivo, o trabalho digno para todos
e a proteção social; Oceanos e mares;
Pequenos Estados insulares em desenvolvimento
(SIDS); Países menos desenvolvidos;
Países menos desenvolvidos sem litoral;
África; Os esforços regionais; Redução
do risco de desastres; As mudanças
climáticas; Florestas; Biodiversidade; Desertificação
degradação do solo, e seca;
Montanhas; Produtos químicos e resíduos;
Consumo e produção sustentáveis;
Mineração e Educação.

Comentário: Todos estes tópicos estão
razoavelmente bem colocados e de acordo
com as recomendações científicas. Mas
também depende da forma de implementação
nos anos vindouros. O tópico “A igualdade
de gênero e o empoderamento das
mulheres” reafirma o papel vital das mulheres
no processo de desenvolvimento sustentável,
levando em consideração a participação
plena e igualitária e a implementação
dos respectivos compromissos e de
acordo com a Convenção sobre a Eliminação
de Todas as Formas de Discriminação
contra as Mulheres (CEDAW) bem como a
Agenda 21, a Plataforma de Ação da Declaração
de Pequim e a Declaração do Milênio.

O PARÁGRAFO 237 AFIRMA: “APOIAMOS MEDIDAS
QUE PRIORIZEM A PROMOÇÃO DA IGUALDADE
DE GÊNERO E O EMPODERAMENTO DAS MULHERES
EM TODAS AS ESFERAS DE NOSSAS SOCIEDADES,
incluindo a remoção das barreiras à
sua participação plena e igualitária na tomada
de decisões e gestão em todos os níveis,
e enfatizamos o impacto da definição de metas
específicas e implementação de medidas
temporárias, conforme apropriado, para aumentar
substancialmente o número de mulheres
em posições de liderança, com o objetivo
de alcançar a paridade de gênero”.

Comentário: A reafirmação da Plataforma de
Ação da Conferência de Beijing, de 1995, foi
um grande avanço em relação ao Draft Zero de
janeiro de 2012, pois a equidade de gênero é
Prometer uma abordagem holística para
garantir a integridade dos ecossistemas
é ótimo, mas sem recursos financeiros
se torna vazia.
“Marcello Casal Jr/AB

Cidadania&MeioAmbiente

fundamental para o desenvolvimento sustentável
e a plena participação social das mulheres.
Este tópico foi um avanço também em relação
à Cúpula da Terra de 1992. Houve um compromisso
de fortalecer a ONU Mulher.

O TÓPICO SOBRE A “UNIVERSALIZAÇÃO DA SAÚ-
DE REPRODUTIVA” ESTÁ ASSIM COLOCADO NO ARTIGO
241: “Estamos empenhados em promover
a igualdade de acesso das mulheres e
meninas à educação, aos serviços básicos,
oportunidades econômicas e serviços de
saúde, abordando a saúde da mulher sexual
e reprodutiva e assegurar o acesso universal
aos métodos modernos de planejamento
familiar, que sejam seguros, eficazes, aceitáveis
e acessíveis. Neste sentido, reafirmamos
nosso compromisso de implementar o
Programa de Ação da Conferência Internacional
sobre População e Desenvolvimento
(Cairo 1994) e as ações fundamentais para o
prosseguimento da execução do Programa
de Ação da Conferência Internacional sobre
População e Desenvolvimento (CIPD)”.

Comentário: O movimento feminista considerou
que a ausência do termo “direitos
sexuais e reprodutivos” foi um recuo e uma
moeda de troca entre os negociadores do
documento e as forças do fundamentalismo
religioso e do conservadorismo moral.
Porém, houve avanço em relação ao Draft
Zero, pois foram reafirmados os direitos à
saúde reprodutiva e os princípios do Programa
de Ação da CIPD do Cairo de 1994.
Também as questões da dinâmica demográfica
foram minimamente consideradas no
documento. O tema dos direitos reprodutivos
será a grande batalha do Cairo+20.

O ITEM B, TRATA DA QUESTÃO DOS OBJETIVOS DO
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL (ODS), UMA
DAS NOVIDADES DO DOCUMENTO.

O texto diz:

“Reconhecemos que o desenvolvimento de
metas poderia ser útil para prosseguir uma
ação coerente e focada no desenvolvimento
sustentável. Reconhecemos ainda a importância
e a utilidade de um conjunto de objetivos
de desenvolvimento sustentável
(SDGs em inglês), baseados na Agenda 21,
no Plano de Implementação de Joanesburgo
e nos Princípios do Rio 1992. Esses objetivos
devem abordar e incorporar de forma
equilibrada todas as três dimensões do desenvolvimento
sustentável e suas inter-relações.
Eles devem ser coerentes e integrados
na Agenda de Desenvolvimento das
Nações Unidas para além de 2015, contribuindo
assim para a realização do desenvolvimento
sustentável e servindo como um guia
para a implementação e integração do desenvolvimento
sustentável no sistema das
Nações Unidas como um todo. O desenvolvimento
destas metas não deve desviar a
atenção ou o esforço da realização dos Objetivos
de Desenvolvimento do Milênio”.


Comentário: A definição dos ODS foi adiada,
mas pode se tornar um importante instrumento
de ação e de monitoramento do
processo de degradação do meio ambiente.
Tudo vai depender do processo de definição
e de implementação dos indicadores e
das metas quantitativas a serem definidas.

O TÓPICO 6 TRATA DOS MEIOS DE IMPLEMENTAÇÃO.
EVIDENTEMENTE ESTE É UM DOS TÓPICOS
MAIS DIFÍCEIS, POIS DIZ RESPEITO AO

FORTALECIMENTO
DAS INSTITUIÇÕES E À NECESSIDADE DE
RECURSOS FINANCEIROS PARA IMPLEMENTAR OS
PRINCÍPIOS E SUGESTÕES APROVADAS.
Pelo menos três pontos importantes ficaram
de fora do documento:

a) A falta de compromisso claro para eliminar
os subsídios da indústria dos combustíveis
fósseis;

 b) A falta de uma defesa clara dos
direitos dos animais e da luta pela erradicação
do ecocídio;

 c) A falta de reconhecimento
dos limites do Planeta e a impossibilidade
de continuar mantendo um modelo de
crescimento indefinido da economia.
Assim, pode-se afirmar que o documento final
da reunião dos Chefes de Estado da
Rio+20, ocorrida entre 20 a 22 de junho de
2012, não agendou adequadamente as medidas
necessárias para evitar o colapso ambiental
do Planeta. Enquanto a reunião do G-
20, de 18 e 19 de junho no México, injetou
bilhões de dólares no FMI para tentar evitar
a crise econômica, nenhum dinheiro concreto
foi garantido para a crise ambiental.
Porém é preciso ter cuidado com as críticas
intempestivas, pois os defensores dos lucros
da indústria de combustíveis fósseis,
os setores conservadores e os céticos do
clima sempre são contra qualquer tipo de
Conferência da ONU, pois se recusam a
aceitar a regulação do mercado e o controle
da poluição. Criticas construtivas são sempre
bem vindas, mas não dá para ignorar o
fato de que hoje em dia cresce a consciência
ambiental e os próprios governos são
obrigados a lidar com a gravidade da situação.
A grande mobilização provocada pela
Rio+20 gerou resultados positivos, pelo
menos no que se refere à tomada de consciência
da gravidade da situação.
Evidentemente, muita coisa falta ser feita
para interromper a marcha rumo ao ecocídio
e à destruição da natureza. Foi baixa a dose
de ambição e de ação do documento “O
futuro que queremos”. Há poucas metas
concretas e muitas platitudes. Mas, tentando
ser otimista, o resultado final da Rio+20
pode ser considerado um pequeno passo,
entre tantos outros que precisam ser dados.
O mundo agora sabe da necessidade
de se tomar medidas urgentes para limitar
as atividades antrópicas. Os passos decisivos
ainda precisam ser dados no sentido
de garantir uma base mínima de cidadania,
respeitando as fronteiras planetárias. Vale
o slogan: “Mais acesso e menos excesso”.


A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento
Sustentável de 2012 foi apenas
mais uma etapa de uma luta que passa
pela mobilização e a conscientização de todos,
mas principalmente passa pelo fortalecimento
e empoderamento da sociedade civil,
para que na Rio+40 as discussões e deliberações
do Aterro do Flamengo avancem mais
do que as formalidades do Riocentro

. ■
José Eustáquio Diniz Alves – Colunista do
Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e
professor titular do mestrado em Estudos Populacionais
e Pesquisas Sociais da Escola Nacional
de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE;
Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal.

Texto publicado no portal EcoDebate (27 /
06 /2012).E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

O desenvolvimento
só será realmente
ambientalmente
sustentável se for
ecocêntrico,
garantindo o futuro
sustentável não só
dos seres humanos,
mas de todas as
espécies vivas.


10
A abertura oficial, comandada pela pre
sidenta brasileira, Dilma Rousseff, e
pelo Secretário Geral da ONU, Ban
Ki Moom, foi realizada em um ambiente insosso,
burocrático. Os governantes discursaram
para uma plateia desinteressada e como se
tivessem copiado um o discurso do outro. Monocórdios,
sem luz, sem compromisso repetiam
a mesma ladainha, sem brilho e vigor. Esse foi o
sentimento predominante dos representantes
da sociedade civil que assistiram a abertura.
Pensar que em 1992 o mundo vivia a expressão
máxima do neoliberalismo, quando
presenciou o desmantelamento do papel do
Estado, a transferência progressiva do poder
às grandes corporações financeiras,
comerciais, industriais e agrárias. Hoje, observamos
um processo declarado de apropriação
privada do espaço público de forma
geral e irrestrita, inversão de uma ordem
que nos custa reverter 20 anos depois e
com a anuência dos governos.
Vimos governos fracos, apresentando um
documento inconsistente e sem a ambição
necessária para reagir à destruição do Planeta,
que ainda pensam na lógica do crescimento
econômico como base para o enfrentamento
das crises econômica, social e ambiental.
Nosso cenário, em números, é desanimador.
Constatamos que existem mais de um bilhão
de pessoas ameaçadas de morrer de fome, que
por Iara Pietricovsky
Pressionados por uma lógica de “cada um por si e o mundo que se
dane”, os governos nos levaram a assistir uma farsa.
a distância entre ricos e pobres está aumentado,
com 70% dos recursos mundiais desfrutados
pelos 20% mais ricos, enquanto aqueles
no quintil inferior ficam somente com 2%. Comprovamos
uma ausência de vontade política
dos países mais ricos em mudarem seu padrão
de consumo, estilo de vida, porque em grande
medida é disso que se trata: os mais ricos são
os maiores responsáveis por este padrão que
se mostra esgotado e em crise. Lacunas e falta
de vontade política no momento de colocar em
prática os acordos internacionais, a Agenda
21, os Princípios do Rio, que saíram das Rio92,
e todos os outros do Ciclo Social. A nossa
crise é de implementação e não de ausência de
um marco decente para que possamos fazer a
mudança de modelo de desenvolvimento. É
uma tensão política e econômica, onde os algozes
defensores de um modelo predatório
insistem em sua sobrevivência e hegemonia.
O documento aprovado retrocedeu nos direitos
das mulheres, não resolveu o problema do
financiamento ao desenvolvimento sustentável
e muito menos os problemas diretamente
relacionados à mudança climática, assim como,
não solucionou o problema de transferência
de tecnologia, direito a água, piso social básico,
entre muitos dos temas fundamentais para
que os direitos humanos sejam efetivados e os
países caminhem para a sustentabilidade.
Mesmo naquilo que o documento aponta
como positivo, a linguagem é pouco substanciosa,
voluntária e fragiliza os Princípios
aprovados há 20 anos na Rio92. Os governos
reconhecem a crise econômica e sua profundidade,
no entanto, não se mostraram
corajosos nas decisões que poderiam atacar
esta situação. A proposta dos Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável deveria estar
vinculada aos Princípios de responsabilidades
comuns, porém diferenciadas; país poluidor-
pagador e o da precaução, o que infelizmente
não ocorreu, a sua citação é frágil.
O que nós, da Cúpula dos Povos, preconizamos
é que a efetivação dos direitos e a
busca de processos sustentáveis só será
possível, com novas formas de fazer política,
com participação das populações, em
especial, aquelas afetadas por este desenvolvimento
predatório, assim como com
outra forma de relação política entre os povos
do Planeta. Os países e seus governos
não podem mais trabalhar na lógica dos interesses
econômicos, mas sim da solidariedade
e da mudança radical de padrões de
produção e consumo. Cada país possui uma
responsabilidade neste processo e deveria
estar atuando de forma efetiva.


Iara Pietricovsky é antropóloga, membro do
colegiado de gestão do Inesc e do Comitê
Facilitador da Sociedade Civil Brasileira para
a Rio+20. Artigo socializado pelo Inesc /Instituto
de Estudos Socioeconômicos e publicado
pelo portal EcoDebate (22/06/2012).


“A Rio+20 não foi exatamente um bom
exemplo de progresso nas discussões. Acredito
que poderemos fazer alguns acordos
internacionais, mas não agora, temos que
esperar uns anos mais”. Assim, o cientista
mexicano Mario Molina, Prêmio Nobel de
Química em 1995, resumiu a Conferência da
ONU. Ele participou de diversas discussões
relacionadas a temas de meio ambiente durante
o 62º Lindau Nobel Laureate Meeting,
evento que reuniu 27 ganhadores do Prêmio
Nobel e 592 jovens cientistas em Lindau,
no sul da Alemanha, de 1º a 6 de julho.
CFC E CAMADA DE OZÔNIO
Químico de formação, Molina tornou-se célebre
por descobrir que os clorofluorcarbonetos
(CFC) são nocivos à camada de ozônio.
Em 1995, ele dividiu o Prêmio Nobel com
Paul Crutzen e Sherwood Rowland “por seu
trabalho na química atmosférica, em especial
a que estuda a formação e decomposição
da camada de ozônio”. Para Molina, a
Rio+20 foi prejudicada pela conjuntura atual
na economia mundial, afetada pela crise,
mas funcionou como uma “chamada para
despertar” a consciência das pessoas.
“A mensagem mais forte é que se não nos
preocuparmos com o meio ambiente, o
custo será muito maior, será mais difícil
realizar o desenvolvimento econômico”,
ressalta Molina ao lembrar ser importante
estimular o trabalho conjunto de cientistas
e economistas. “Precisamos nos comunicar
mais entre nós e com a sociedade para
repassar que precisamos fazer mais sacrifícios
para resolver o problema”, pontua.
Conselheiro do Governo do presidente Barack
Obama para temas de Ciência e Tecnologia
e com sólida carreira nos Estados Uni-
Um despertar
O Prêmio Nobel Mario Molina diz ser preciso ‘esperar alguns
anos’ para colher resultados da Rio+20. por Clarissa Vasconcellos
dos, Molina aponta a política interna dos
EUA como um dos principais entraves para
acordos internacionais, especialmente as
forças dentro do Partido Republicano. Porém,
afirma que dentro dessa ilha conservadora
há representantes “com ideias mais
racionais que as linhas de seu partido” e
lembra que cerca de metade da população
americana “está pronta para aceitar mudanças”
nos padrões de comportamento.
“Isso me faz mais otimista”, conta.
Polêmica – Molina acredita na teoria que relaciona
as atuais tragédias provocadas por enchentes,
furacões e outros fenômenos naturais
à atividade humana e crê que esse tipo de
acontecimento “vai empurrar a sociedade à
reação”. Perguntado sobre o que acha das
opiniões de físico Ivar Giaever, que, em sua
conferência em Lindau classificou como uma
“nova religião” a questão do aquecimento global,
Molina não pensou duas vezes ao criticar
o cientista norueguês. “Infelizmente, o doutor
Giaever ganhou um Prêmio Nobel em um
campo da Física que não tem nada a ver com
mudanças climáticas. Ele mostrou em sua
palestra que não conhece nada de mudanças
climáticas, cometeu erros enormes, então,
é uma pena”. Premiado com o Nobel de
Física em 1973 por suas experiências com semi
e supercondutores, Giaever tornou-se referência
entre os cientistas que negam a influência
das ações humanas nas mudanças climáticas.
Giaever trata como “casos isolados” tragédias
como o furacão Katrina, em Nova Orleans.
“Eu gostaria de sentar e conversar
com ele, introduzir um pouco de consciência
para que ele pesquise mais. Não basta
entrar na internet e buscar uns dados por
alguns minutos, você deve explorar a literatura
científica. Acho que foi muito embaraçoso
ter um Prêmio Nobel prestando esse
papel ridículo”, dispara Molina.
Hidrelétricas – O cientista mexicano opinou
também sobre outro tema controverso, a construção
de hidrelétricas, em especial as que envolvem
deslocamentos de população e uso
de áreas produtivas. “Todas as mudanças têm
algum impacto e a expectativa é que os positivos
se sobressaiam. A energia hidrelétrica
tem o lado bom de não contaminar o meio
ambiente, mas é preciso fazer isso de forma
adequada”. Molina conta que a “tendência
moderna” nesse campo é construir mini-hidrelétricas,
para justamente minimizar essas consequências.
“Em nosso continente [América
Latina] não exploramos o potencial de minihidrelétricas.
No entanto, o que realmente
precisamos priorizar é a não utilização de
combustíveis fósseis. Ainda que seja um custo
adicional no momento, ele é muito menor
que o dano que vai causar”, enfatiza.
Molina acredita que a América Latina precisa
“parar de importar porcarias” e padrões de
tecnologia que muitas vezes funcionam apenas
nos países mais desenvolvidos. “O continente
precisa estar pronto para, por exemplo,
ser um piloto de desenvolvimento de
energia solar. A Alemanha a usa em larga
escala e não tem tanto sol quanto as zonas
tropicais”, ilustra, ressaltando também a importância
de capacitar pessoas, promover
incentivos, cooperar com países em desenvolvimento,
educar o público a respeito das
ameaças ao meio ambiente e remover subsídios
aos combustíveis fósseis. ■
Clarissa Vasconcellos – Texto publicado
no Jornal da Ciência / SBPC, JC e-mail 4536, e
republicada pelo EcoDebate (11/07/2012).
condseciências
PÓS
RIO
+20
12
Entrevista de Liszt Vieira por Patricia Fachin/IHU On-line
IHU ON-LINE – POR QUE CONSIDERA QUE A RIO+20

COMEÇOU
TENDENDO AO FRACASSO? COMO AVALIA A

CONFERÊNCIA?
Liszt Vieira – Porque os sistemas de decisão são baseados num
consenso, e é difícil encontrar um consenso quando se envolve
mais de 150 países: os interesses são diferentes, contraditórios.
Esse sistema está falido, e a ONU está à beira da falência, por
inoperância, falta de dinamismo interno para tomar decisões.

Então,
de antemão, já se sabia que a conferência poderia ser considerada
um sucesso diplomático, mas um fracasso ambiental. Tratase
da crônica de um fracasso anunciado.
Desse ponto de vista, a governança global foi posta na mesa e
nem se quer foi discutida. A única coisa que os chefes de Estado
recomendaram foi o fortalecimento do Programa das Nações

Unidas
para o Meio Ambiente (PNUMA). Os demais temas foram
“arranhados” superficialmente para que se pudesse encontrar um
mínimo denominador comum, que foi encontrado, mas que não
correspondeu às expectativas mínimas e nem está à altura dos
problemas ambientais que ameaçam o planeta.
IHU – A ONU AINDA TEM RELEVÂNCIA INTERNACIONAL?
L.V. – A ONU não tem relevância porque não toma decisões. O
núcleo duro da ONU é o Conselho de Segurança, formado por
cinco países permanentes (EUA, França, Reino Unido, Rússia e
China), que decidem por unanimidade desde o fim da Segunda
Guerra Mundial. Os países que perderam a Guerra, como

Alemanha
e Japão, estão fora desse núcleo, e se um dos cinco países
vetar algo, não há avanço. Não existe um sistema de governança
mundial. Fora da ONU, existe a Organização Mundial do

Comércio
(OMC), que aplica sanções para o bem ou para o mal, ou seja,
estabelece as regras do jogo. Quem não cumpre as regras, pode
ser sancionado. Então, a OMC tem uma efetividade. O Tribunal
O sociólogo e ambientalista
Liszt Vieira
critica o fato de
um dos temas centrais
da Rio+20 – a
governança global
– ter sido posta na
mesa e nem sequer
discutida.
Penal Internacional julga e condena genocidas e tem alguma

efetividade,
mas todos estão fora do sistema da ONU.
A ONU está em crise, paralisada. Claro que é melhor existir do

que
deixar de existir, porque o mundo é melhor com a ONU do que

sem
ela. Mas o problema é que ela não consegue dar respostas aos
problemas que surgem no mundo.
IHU – ESSA INEFICIÊNCIA É RECENTE OU TEM A VER

COM A FORMAÇÃO
HISTÓRICA DA ONU?
L.V. – Claro que tem a ver com o sistema que foi adotado, que

funcionou
durante algum tempo, mas que diante de grandes crises fica

paralisado.
O caso é que a questão ambiental está se tornando uma grande

crise
ecológica, que aponta para uma crise de civilização. A ONU não

consegue
dar resposta a isso, porque seus encontros internacionais acabam
aprovando documentos que são o mínimo denominador comum de

180
países, sempre muito aquém do que seria necessário. A grande

derrota
é a ONU estar impotente para enfrentar problemas.
Em todas as áreas estamos vendo essa incapacidade de avançar e
tomar decisões, porque um país é baseado no petróleo, outro quer
investir em energia renovável. Há uma série de interesses na

agenda
ambiental. Vi, em Joanesburgo e na Rio+10 que quando um país
condenava o combustível fóssil e recomendava o uso de energia
renovável, um país árabe que tinha petróleo dizia: “Se você fizer

isso
eu não compro mais a sua soja, o seu minério”. Quer dizer, as
questões comerciais também estão presentes, embora oficialmente
não se trate de comércio. Então, é difícil avançar nesse

emaranhado.
Além disso, quando algumas decisões são tomadas por consenso,
não são cumpridas porque cada país tem de ratificar as decisões

nos
parlamentos nacionais, o que não é feito. E os países não

cumprem
internamente os tratados e convenções assinados.
Impotência da ONU: a grande derrota
PÓS
RIO
+20
Roberto Stuckert Filho-PR
Cidadania&MeioAmbiente 13
No caso da Rio+20, não houve nenhum documento a assinar;
foram apenas recomendações apontando caminhos, mas nenhum
caminho foi apontado. Os chefes de Estado apenas reafirmaram o
compromisso de 20 anos atrás, da Eco-92, mas nem todos os

acordos
foram reafirmados; alguns ficaram no limbo e não foram

mencionados.
Só quando “estourar” uma crise mais adiante, daqui a
uns 10 anos, os países irão acordar.
IHU – COMO AVALIA O RASCUNHO ZERO DA RIO+20? QUE

TEMAS
CENTRAIS FICARAM DE FORA DO DOCUMENTO?
L.V. – Muita coisa ficou de fora, como prazos e metas concretas
em relação à energia, ao clima, à biodiversidade. Deveriam ter

estipulado
datas e metas concretas. Pelo que eu sei, o único avanço
diz respeito à proteção dos oceanos, algo que teve um nível de
concretude. Os demais assuntos foram discutidos numa linguagem
abstrata, que não compromete e não obriga.
IHU – É POSSÍVEL FAZER UMA COMPARAÇÃO ENTRE A

ECO-92 E A
RIO+20? DIRIA QUE HOUVE MAIS AVANÇOS HÁ 20 ANOS?
L.V. – A Eco-92 tinha mais expectativas e esperança, porque

houve
a assinatura de convenções. Mas para poder assinar convenções
do clima, por exemplo, os EUA exigiram esvaziá-la. Então,
houve muita concessão em todas as convenções, seja do clima, da
biodiversidade, da desertificação. Em relação às florestas, nem
houve convenção, mas sim um protocolo, que é um grau

hierárquico
menor. Em contrapartida, na Eco-92 foram aprovadas a Agenda
21 e a Carta da Terra. Então, houve mais seriedade nas

conclusões
finais, embora também tenha havido muita decepção porque se
queria que os governos estivessem à altura do esperado e não
estiveram. Mesmo assim, o resultado foi muito superior ao que se
vê hoje na Rio+20, que teve um resultado desastroso, embora
diplomaticamente todos os países tenham assinado o documento
final, o que é muito positivo. Mas está longe de apresentar um
esforço no sentido de equacionar os problemas do planeta.
IHU – COMO VÊ A AGENDA AMBIENTAL BRASILEIRA,

ESPECIALMENTE
DEPOIS DA ECO-92?
L.V. – O Brasil está bem e tem uma boa imagem em matéria

ambiental
porque sua matriz energética é renovável. No exterior, o país é
muito respeitado. Na Inglaterra, menos de 3% da energia é

renovável;
na Europa, a média é cerca de 8%, enquanto que no Brasil é de
50%. A hidrelétrica, em princípio, é renovável. Outro debate é

discutir
se Belo Monte deve ou não ser construída, porque tem-se de
avaliar a relação custo/benefício: se o governo gasta muito e a
capacidade energética é pequena não vale a pena, mas se gasta
pouco e tem uma capacidade energética boa, vale.
O Brasil poderia assumir uma liderança ambiental maior porque

está
numa situação relativamente confortável. O grande vilão era o

desmatamento,
mas ele foi controlado, e a Amazônia está preservada. De um
modo geral, olhando o mundo como um todo, o Brasil está bem.
Obviamente, críticas podem ser feitas e o governo poderia ser mais
agressivo na proteção das florestas, na ecologia urbana, em

saneamento
básico etc. Mas nos últimos 20 anos, o país cresceu, aumentou
a renda, reduziu o número de pobres. O problema ambiental é

global,
e não adianta um único país fazer o dever de casa. Mesmo que ele

não
polua nada, vai sofrer os impactos das mudanças climáticas. Por

isso
a solução tem de ser encontrada no plano mundial. A globalização
não é só econômica, financeira, tecnológica.
Esse processo de globalização fortalece o global e o local em

detrimento
do nacional. Hoje, qualquer empresa multinacional tem mais
orçamento e poder do que a maioria dos países. Além disso, muitas
ONGs ainda têm mais importância no cenário internacional do
que a maioria dos países. Enfim, o mundo mudou e a ONU não
reflete a nova correlação de forças, que é o fortalecimento da

sociedade
civil e dos mercados, e o enfraquecimento relativo de muitos
países. Essa ficção jurídica de que todos os países são iguais,
de que cada país é um voto, leva à paralisia da ONU.
IHU – COMO VÊ A MOBILIZAÇÃO DA CÚPULA DOS

POVOS? ESSAS
MANIFESTAÇÕES TÊM ALGUM IMPACTO POLÍTICO?
L.V. – Elas terão impacto no futuro. No momento, a ansiedade e a
angústia do governo brasileiro era chegar a um acordo, e que a
Rio+20 não fosse vista como um fracasso. Por isso eles apressaram
a conclusão de um acordo em detrimento da qualidade do
texto. Mas a pressão da sociedade civil será muito forte nos países
onde os governos têm de se reeleger, e onde as organizações da
sociedade civil têm peso de mobilização.
Com o agravamento da questão ambiental, essas manifestações

vão
refletir num sentido de maior peso da sociedade civil nas decisões

a
serem tomadas. Mas, no momento, a influência ainda foi pequena.
IHU – UM DOS TEMAS CENTRAIS DA RIO+20 FOI A

GOVERNANÇA
GLOBAL. CONSIDERANDO A “INEFICIÊNCIA” DA ONU,

QUE CARACTERÍSTICAS
UM NOVO ORGANISMO INTERNACIONAL PRECISA TER

PARA LEVAR
EM CONTA A QUESTÃO AMBIENTAL E SOCIAL QUE ESTÁ

EM JOGO
NESSAS DISCUSSÕES?
L.V. – Essa é uma questão complexa, que envolve uma coalizão de
forças do sistema internacional, desde governos, empresas,

sociedade
civil, comunidade científica. São muitos atores que devem
participar desta discussão. Já existem várias propostas para

reformar
a ONU, mas nada foi feito porque os países não estão interessados.
A Rio+20 é uma demonstração da situação atual da ONU,
que não consegue dar respostas. Só quando estourar a crise

econômica,
social e política de forma mais aguda, decisões contundentes
serão tomadas. Isso deve acontecer nos próximos 10 anos.
Por outro lado, a consciência ambiental aumentou muito entre as
novas gerações, e também nas empresas. Na Eco-92 havia só dois
polos: o governo e sociedade civil. Hoje muitas empresas já

despertaram
para a questão da sustentabilidade, porque irão perder

produtividade
e terão prejuízos se não se readaptarem. A comunidade científica
também teve uma participação muito pequena na Eco-92, mas

hoje
está mais ativa e mobilizadora. Esses atores que surgem irão

pressionar
os governos para aumentar a velocidade e a qualidade das

decisões.
A ONU será obrigada a encontrar mecanismos de tomada de
decisão que sejam mais adequadas à gravidade da questão, e levar

em
conta a pressão que estão sofrendo desses novos atores. ■
Liszt Vieira – Graduado em Direito, Ciências Sociais e doutor em

Sociologia
pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro –
IUPERJ. Foi um dos Coordenadores do Fórum Global da

Conferência
Rio-92, e leciona no Departamento de Direito da Pontifícia

Universidade
Católica do Rio de Janeiro – PUC-Rio. É presidente do Jardim

Botânico
do Rio de Janeiro desde 2003. Entrevista por Patricia Fachin para

o IHU
On-line (Instituto Humanitas Unisinos da Universidade do Vale do

Rio
dos Sinos, São Leopoldo, RS) e publicada no portal EcoDebate.
14
ARio+20 não foi um fracasso pelo sim
ples motivo que, de verdade, nin
guém esperava que fosse um sucesso.
Tolices e bravatas à parte, ela apenas
reforçou as críticas que o modelo consensual
da ONU é insuficiente para liderar as
transformações que se fazem necessárias.
No entanto, em paralelo ao evento diplomático,
ocorreram significativos avanços
nos Major Groups e na Cúpula dos Povos.
Os chamados Major Groups, compostos por
representantes da sociedade civil, concentrados
em áreas temas [Negócios e Indústria /
Crianças e Jovens / Agricultores / Povos Nativos
/ Autoridades Locais / ONGs / Comunidade
Científica e Tecnológica / Mulheres /
Trabalhadores e Sindicatos] trabalharam intensamente,
produzindo discussões e trabalhos
técnicos de suporte, que poderiam ter
orientado as decisões das delegações.
Poderiam, mas, ao final, foram solenemente
ignorados. Nada discutido ou produzido
nos Major Groups foi aproveitado no
texto final. Em geral, nada aconteceria, mas
desta vez, estes participantes reagiram com
vigor, reafirmando que a sociedade civil lá
estava para colaborar e ser ouvida.
Novamente ignorados, os participantes
(pesquisadores, cientistas, ativistas, representantes
de ONGs, etc…) emitiram a
e a cartinha ao Papai Noel
por Henrique Cortez
Os governos fracassaram,
mas a
sociedade civil,
nos Major Groups
e na Cúpula dos
Povos, mostrou
que as mudanças
já começaram e
vieram para ficar.
nota A Rio+20 que a sociedade civil não
quer é a que está aí e formalmente se retiraram
do plenário.
Sem respostas, os integrantes da sociedade
civil subiram o tom entregando os crachás,
em ato de protesto e publicando uma
carta aberta contra texto final (leia no quadro
a íntegra da carta). Pode parecer pouco,
mas foi uma reação inédita e com repercussão
internacional. Foi um importante
avanço e merece destaque.
De sua parte, a Cúpula dos Povos na Rio+20
por Justiça Social e Ambiental – evento organizado
pela sociedade civil global, entre os
dias 15 e 23 de junho, no Aterro do Flamengo,
no Rio de Janeiro, paralelamente
à Conferência da ONU sobre Desenvolvimento
Sustentável (UNCSD) – também merece
destaque pelas discussões, mobilização e
avanços apresentados. Um evento com livre
acesso à população e intensas discussões
públicas contra a mercantilização da vida e
em defesa dos bens comuns. Milhares de
pessoas visitaram a Cúpula dos Povos, acompanhando
as discussões e livremente obtendo
informações com centenas de ativistas.
Além dos debates, as plenárias produziram
documentos com sugestões, colaborações
e propostas entregues ao secretário
geral da ONU, Ban Ki-moon.
No âmbito dos Direitos (por justiça social
e ambiental), que corresponde
à Plenária 1, ficou acordado que para garantir
esses direitos é preciso, dentre outras
medidas, fortalecer os direitos humanos e
mudar as políticas públicas, o sistema de
produção capitalista que domina, oprime e
promove o etnocídio das culturas populares.
Em relação à defesa dos bens comuns e
à mercantilização da vida (Plenária 2),
acordou-se que, para ter direito à terra e ao
território, é preciso uma regulamentação fundiária,
sendo a Cartografia Social, segundo
as organizações participantes, o instrumento
para atingir esse objetivo. É preciso haver
políticas públicas destinadas a estruturar essas
mudanças e financiar projetos socioambientais
para as comunidades.
A soberania alimentar, defendida na Plenária
3, determinou que, para obtê-la, é necessário
fortalecer o pequeno agricultor, o
camponês e o indígena. É preciso controlar
o uso de agrotóxicos em escala industrial e
fortalecer o ideário da agroecologia.
Em relação à energia e às indústrias
extrativas, assunto da Plenária 4, ficou
acordado que as energias renováveis e de
controle descentralizado são a saída para
a crise energética mundial. É preciso ainda
que as organizações que poluem e cau-
A Cúpula...
PÓS
RIO
+20
Andrea Arzaba
Cidadania&MeioAmbiente 15
sam impactos ambientais negativos sejam
adequadamente punidas.
Sobre o trabalho, debatido na Plenária 5,
ficou decidido que a reforma agrária, a
abolição do agronegócio e a negação
à mercantilização da natureza
são medidas importantes para regulamentar
e humanizar o trabalho. A punição
para a violação de direitos trabalhistas
também foi tema defendido pelos
participantes da Cúpula dos Povos.
A Declaração final da Cúpula dos Povos
na Rio+20 merece uma leitura atenta, porque
claramente demonstra que a sociedade
civil sabe o que quer e o que é preciso fazer.
E também merecem destaques as mobilizações,
destacando a Marcha das Mulheres e a
Manifestação em defesa dos bens comuns e
contra a mercantilização da vida. A primeira,
realizada em 18/6, no Centro do Rio de Janeiro,
reuniu cerca 8 mil pessoas de várias
partes do mundo: o primeiro ato público realizado
no âmbito da Cúpula dos Povos
No dia 20/6, a manifestação em defesa dos
bens comuns e contra a mercantilização da
vida, realizada na avenida Rio Branco, com
a participação de estudantes e representantes
de movimentos sociais, reuniu, pelo
menos, 50 mil pessoas. Talvez 80 mil, de
acordo com os organizadores. Pouco importa,
porque 50 mil pessoas é mais do
que suficiente para torná-la a mais significativa
e representativa da última década.
Enfim, em paralelo à Rio+20, os avanços
foram importantes e visíveis. Quanto à
Rio+20 e seu documento “O Futuro que
Queremos” se não foi um retrocesso em
relação à Cúpula da Terra (Eco92) certamente
também não foi um avanço.
Na realidade, o documento mais me parece
com uma carta a Papai Noel:
Querido Papai Noel… Prometo que vou ser
bonzinho… Prometo que não vou fazer
malcriação … Prometo que vou estudar … E
prometo que não vou mais bater no meu
irmãozinho… Promessas, meras promessas,
mas nada de compromissos.
Os governos, representados por suas delegações,
fracassaram como esperado, mas
a sociedade civil, nos Major Groups e na
Cúpula dos Povos, mostrou que as mudanças
já começaram e vieram para ficar.
Neste aspecto, mesmo sem querer, a
Rio+20 foi um sucesso. ■
O FUTURO QUE NÃO QUEREMOS
“Sem o nosso consentimento!!! Removam com a plena

participação
da Sociedade Civil” presente no parágrafo 1 do texto oficial.
Nós – organizações da sociedade civil e movimentos sociais e de

justiça que
responderam ao apelo da Assembléia Geral das Nações Unidas

para participar
no processo da Rio +20 – acreditamos que o estado atual das

negociações
ameaça severamente o futuro de todos os cidadãos do mundo e

compromete a
relevância e credibilidade das Nações Unidas.
Depois de mais de dois anos de intensas negociações e milhões de

dólares
investidos na conferência ONU CDS 2012 Rio+20, os governos

permanecem
incapazes e demonstram falta de vontade em reafirmar os

compromissos que
fizeram no Rio em 1992 em matéria de princípios fundamentais.
Os governos devem ter presentes que recebem seus mandatos a

partir das pessoas,
dos seus eleitores e para quem têm o dever de agir no seu melhor

interesse.
Governantes devem estar imbuídos de uma visão a longo prazo, de

uma mentalidade
ecologicamente informada, para assim garantir o desenvolvimento

sustentável
das civilizações e o melhor futuro para todos, o futuro que todos

nós
realmente queremos.
Embora os governos sejam aparentemente incapazes de lidar

resilientemente
com a atual crise econômica global (um problema assumido na

reunião do
G20, neste fim de semana no México), nós acreditamos que este é

o momento
perfeito, com caráter potencialmente catártico, para adotar o

desenvolvimento
sustentável e medidas de justiça social e ambiental. Esta não é a

hora de abandonar
estes valores por razões de políticas fiscais de austeridade ou por

alegadas
pressões de pró-crescimento no hemisfério Norte. Por isso,

apelamos ao
Governo do Brasil, ao Secretário-Geral da UN CSD e a todos os

Estados-Membros
a parar de negociar suas agendas nacionais de curto prazo e a

acordar
urgentemente em ações de transição para o progresso sustentável

global.
Queremos que os Governos forneçam ao povo sua legítima agenda

e a realização
de seus direitos, da democracia e da sustentabilidade, bem como o

respeito pela
transparência, responsabilidade e que honrem as promessas e

progressos feitos
até hoje. Infelizmente, o tempo está se esgotando. Um acordo

apressado e ineficiente
não será aceitável para nós, nem representará o futuro que todos

queremos.
Apelamos aos nossos concidadãos, 99% do mundo a erguerem-se

pelo futuro que
realmente queremos, e não este imposto por uma minoria: 1%

(negociadores e elites
constituintes). Em suma, que as vozes da maioria finalmente

moldem o futuro.
Henrique Cortez, coordenador editorial
do Portal EcoDebate, com informações da
Cúpula dos Povos.Publicado no portal
EcoDebate (25/06/2012).
Julius Mucunguzi-Commonwealth Secretariat
16
Segundo Herren, os maiores desafios para
a agricultura e o sistema alimentar são a
necessidade de abordar a fome e a pobreza,
promover uma melhor nutrição e saúde,
adaptação à mudança climática, reduzir as desigualdades
e dar apoio aos meios de subsistência
rural. Segundo Herren, a agricultura deve
fornecer uma quantidade suficiente de fibras e de
alimentos de qualidade ao mesmo tempo acessível
aos consumidores, economicamente viável para os
produtores e sustentável para o meio ambiente.
Ele acredita que os três maiores problemas enfrentados
pela agricultura são a mudança climática, a
concorrência com o setor de biocombustíveis, o
aumento dos preços da energia fóssil e a iminente
escassez dos combustíveis fósseis.
Herren explica que será necessário sistemas agrícolas
mais sustentáveis para enfrentar aqueles desafios,
quais sejam: a agroecologia e agricultura
orgânica e biodinâmica. Mas alerta para a necessidade
de se desenvolver e construir a resistência e
o potencial regenerativo destes sistemas que ainda
utilizam muita água e outros insumos externos
muitas vezes não renováveis. Será necessário trabalhar
mais para tornar tais sistemas mais sustentáveis
nos âmbitos social, ambiental e econômico.
A transição dos sistemas agrícolas insustentáveis
para os que fornecem quantidades adequadas de
alimentos de alta qualidade com o mínimo impacto
ambiental exige uma nova abordagem de pesquisa,
de amplitude e aplicabilidade. Ou seja, deve
ser participativo e localizado, e incluir as partes
interessadas além das envolvidas na produção –
os consumidores e os varejistas do setor. Herren
acredita que esta transição acabará estimulando o
estabelecimento do preço real e justo dos produtos.
Assim, os preços dos alimentos cobrirão a
produção e o período de transição, bem como os
custos de saúde indiretos. O preço justo também
acabará com os subsídios, substituídos pelos pa-
S E G U R A N Ç A A L I M E N T A R
O desafio de alimentar o planeta
por Marlena Branco
Em Eating Planet–
Nutrition Today: A Challenge
for Mankind and
for the Planet (1), Hans
Herren diz como corrigir
o fraturado sistema
alimentar atual..
gamentos por serviços ambientais e recompensas
por práticas sustentáveis.
Herren afirma que agricultura e alimentação são
responsabilidade dos governos exigindo financiamentos
importantes do setor público. Esta responsabilidade
não deve ser delegada exclusivamente
ao setor privado. O gerenciamento dessa
transição de tão grande escala exigirá vontade política
e visão em todos os níveis de governança.
Novas instituições que serão necessárias para dar
suporte e gerir a mudança de paradigma, bem como
para promover a alteração do comportamento do
consumidor. Uma nova abordagem sistêmica e
holística de análise do sistema agrícola e alimentar
também será necessária para identificar os pontos-
chave de alavancagem e sinergia que levem à
concretização dessas mudanças tão vitais.
Solo: base da agricultura sustentável
O elemento base da transição para uma agricultura
mais sustentável é o solo. Nos países em desenvolvimento,
a terra tem sido despojada de nutrientes
enquanto nos países industrializados muitas vezes
ocorre o uso excessivo de fertilizantes: atividades
que resultam num solo pobre, fator que limita a
produtividade agrícola e a sustentabilidade a longo
prazo. Segundo Herren, restaurar a fertilidade do
solo é a preocupação número um para o setor agrícola.
E isso só ocorrerá com melhores sistemas de
cultivo, diversificação das culturas, inclusão de
animais nas fazendas e novos métodos de gestão
de doenças e pragas que utilizar de forma mais
eficiente mecanismos de controle natural.
Herren acredita que a agricultura pode garantir
uma transição bem sucedida para sistemas de
produção mais sustentáveis, e ressalta que o capítulo
sobre agricultura do Relatório sobre Economia
Verde da UNEP (2) (2011) prova que todos
os objetivos-chave da sustentabilidade podem
ser alcançados – com investimentos muito
abaixo dos subsídios atualmente concedidos, via
implementação dos princípios básicos da agricultura
sustentável, tal como sugerido no relatório
IAASTD, “A agricultura na encruzilhada” (3).
Herren afirma que “a agricultura precisa ser verde
por projeto” Simples mudanças marginais não
serão suficientes. A totalidade do sistema de produção
alimentícia deve ajustar-se às demandas de
uma população crescente e às restrições dos recursos
cada vez mais escassos. O que exigirá investimentos
em infra-estrutura rural e ao longo da cadeia
de valor que, por sua vez, garantirá mercados
para os produtos agrícolas e ajudará a gerar empregos
de qualidade no setor agrícola para fixar a população
mais jovem no meio rural.
Apesar destes investimentos necessários, um
sistema agrícola mais sustentável viável depende
do progresso científico e de vontade política.
Herren acredita que esse objetivo pode ser alcançado
“ao promovermos avanços transformadores
nas ciências agrícolas e nas decisões
políticas, os sistemas agrícolas e alimentares
acabam se tornando sustentáveis.” ■
Hans Herren é entomologista, agricultor e especialista
em desenvolvimento, laureado com o
World Food Prize, co-presidente da IAASTD e
presidente do Millennium Institute. Marlena
Branco é pesquisadora do Nourishing the Planet.
Artigo publicado em junho de 2012 em
www.worldwatch.org/sow11/
REFERÊNCIAS
(1) Eating Planet 2012 – BCFN Barilla Center
(www.barillacfn.com), WorldWatch Institute
(www.worldwatch.org). O livro digital pode ser comprador
em na Amazon ou i Tunes por UD$3.99.
(2) UNEP Green Economy Report (www.unep.org/
greeneconomy/greeneconomyreport)
(3) Agriculture at a Crossroads – International Assessment
of Agricultural Knowledge, Science and Technology
for Develop ment (www.agassessment.org)
CIAT
Cidadania&MeioAmbiente 17
S E M I - Á R I D O E C A A T I N G A
um combate ilusório
Entrevista com Márcio Moura
IHU ON-LINE – CONSTA QUE A ATUAL SECA NO

SEMI-ÁRIDO É A MAIOR DOS
ÚLTIMOS 50 ANOS. COMO OS SERTANEJOS ENFRENTAM

ESSES PERÍODOS?
Márcio Moura – Secularmente o Semi-árido brasileiro ainda vive

o dilema
da “indústria da seca”. As populações já diagnosticaram

previamente
quais as necessidades em relação às estruturas hídricas para

garantir água
ao consumo das famílias, plantios e animais. São necessários

investimentos
dos governos federal e estadual, assim como aplicação de recursos
pelos municípios para a construção de açudes, barreiros,

barragens, perfuração
de poços, sistemas adutores, a fim de garantir sustentabilidade
aos agrossistemas no período de estiagem.
Por outro lado, a sociedade civil organizada, através da

Articulação no Semiárido
Brasileiro/ASA (www.asabrasil.org.br), entidade criada em julho

de
1999 como fórum de organizações que atuam em prol do

desenvolvimento
social, econômico, político e cultural do Semi-árido brasileiro),

congrega
atualmente cerca de 750 entidades dos mais diversos segmentos

envolvidos
com essa questão. Nela encontram-se organizações como as igrejas

católica
e evangélica, algumas ONGs, associações comunitárias, sindicatos

e federações
de trabalhadores rurais. Até este momento a ASA já viabilizou a

construção
de mais de 300 mil cisternas de placas de 16.000 litros para o

consumo
humano, o que vem diferenciando em relação à água de qualidade

para as
famílias agricultoras. Esse vem sendo um grande apoio para as

famílias
agricultoras que têm enfrentado a seca.
Para enfrentar os períodos de seca, muitos agricultores/as

investem na
cultura da estocagem, ou seja, guardam água e alimento para o

consumo
familiar. Através de técnicas e práticas como a silagem e fenação,

assegu-
Para o agrônomo Márcio Moura a seca não deve ser combatida

com
superestruturas, mas com investimento nos sistemas familiares

cuja dinâmica
produtiva está relacionada à segurança alimentar, à

comercialização
e à integração com o meio ambiente.
Seca:
ram o alimento para os animais e usam água do barreiro, poços e

açudes
para sustentarem o rebanho. Os que têm menos condições ainda

vendem
os animais aos atravessadores no período mais difícil – de junho a

janeiro
– e esperam chover no próximo janeiro para readquirir os animais,

quando
finalmente se iniciam as chuvas no sertão.
IHU – COMO O SEMI-ÁRIDO APARECE NA AGENDA

GOVERNAMENTAL? O
GOVERNO BRASILEIRO COMPREENDE QUAIS SÃO AS

NECESSIDADES E PRIORIDADES
DA REGIÃO?
M.M.– O governo da Presidente Dilma é muito tecnicista. Está

mais preocupado
com metas e dialoga pouco com a sociedade civil organizada, tanto

que está
desvalorizando o trabalho da ASA, que desenvolveu uma

metodologia participativa
para implementar cisternas de placas de 16.000 e 52.000 litros,

barragens
subterrâneas, bombas populares e barreiros lonados. Essas

propostas deveriam
ser valorizadas, pois entendemos que a obra física deve vir

agregada à construção
do conhecimento técnico com o saber das famílias. Nesse sentido,

as instituições
realizam com as famílias momentos de formação em agroecologia

para
que elas passem a valorizar o meio ambiente e desenvolvam uma

agricultura
mais sustentável via saberes tradicionais.
Através do Ministério da Integração, o governo federal está

implementando
caixas de plástico – visando à campanha eleitoral de 2012 –,

fabricadas em São
Paulo ao dobro do custo das de alvenaria construídas pelas

famílias da região.
Outro equívoco, ainda do governo Lula e que continua no governo

Dilma, é
a transposição do rio São Francisco. O governo investiu milhões

nessa obra,
mas a inviabilidade está sendo demonstrada, pois o canal continua

seco,
18
Minplanpac
Cidadania&MeioAmbiente 19
rachando, e o ministro Fernando Bezerra Coelho continua

solicitando mais
recursos para consertar o que foi iniciado. É mais uma ilusão do

governo,
que acredita que se combate a seca com superestruturas em vez de

investir
nos sistemas familiares cuja dinâmica produtiva está relacionada à

segurança
alimentar, à comercialização e à integração com o meio ambiente.
O lema do governo – “combater a seca” –. é retrógrado: Isso é

uma ilusão,
pois a seca é cíclica, e devemos aprender a conviver com as

adversidades
de um fenômeno que é natural. As famílias precisam de políticas

para
estruturação de seus sistemas com mais recursos hídricos, acesso a

crédito,
assessoria técnica mais qualificada, saneamento básico, educação

de
qualidade,. Enfim, é isso que a zona rural no sertão ainda precisa

para que
as famílias possam viver com mais qualidade e dignidade.
IHU – COMO DESCREVERIA O DESENVOLVIMENTO

SOCIAL E ECONÔMICO DO
SEMI-ÁRIDO? A IMAGEM DE POBREZA E

SUBDESENVOLVIMENTO AINDA PERDURA
OU JÁ COMEÇA A FAZER PARTE DO PASSADO?
M.M. – Acredito que houve avanços. Hoje, estamos num período

de seca,
mas não há invasão a feiras livres. Existem os programas

governamentais
como o Bolsa Família, Bolsa Estiagem, Garantia Safra, Programa

Brasil Sem
Miséria, que são paliativos, mas que acabam auxiliando na

compra de
alimentos. Esses programas não resolvem o problema, apenas

transferem
para a próxima geração, pois não são políticas concretas que

levem os
excluídos a ter acesso aos direitos humanos, econômicos, sociais,

culturais.
Na verdade, é uma maquiagem.
Mas não podemos generalizar. Há o trabalho focado na

agroecologia que a
ASA vem desenvolvendo, inclusive com o Ministério do

Desenvolvimento
Social. Nele, os agroecossistemas familiares foram estruturados, e

as famílias
consomem produtos livres de agrotóxicos, garantem a segurança

alimentar e o
excedente é comercializado na comunidade e na zona urbana

através das feiras
agroecológicas. O Semi-árido ainda é feito de contrastes.
IHU – QUAIS SÃO OS PRINCIPAIS IMPASSES AO

DESENVOLVIMENTO DO
SEMI-ÁRIDO ? ALÉM DA CONCENTRAÇÃO DA ÁGUA E DA

TERRA, QUE ASPECTOS
DESTACA?
M. M. – Há uma cultura assistencialista em que os aspectos

eleitorais não são
valorizados e na qual as pessoas vendem o seu voto por carga

d’água de carropipa,
remédios, cimento. Devido a isso, são eleitas pessoas com pouca

capacidade
de gerir em consenso com a sociedade, mas com muita capacidade

de
enriquecer ilicitamente. A corrupção nas prefeituras municipais é

um dos
principais fatores para o entrave do desenvolvimento no

Semi-árido , apesar
de as organizações da sociedade civil organizada apoiar no

trabalho com as
associações. Ainda falta um despertar para a questão do voto, ou

seja, são os
velhos clãs que dominam a política local, passando de geração

para geração.
Há desvios nos recursos da saúde, educação, agricultura.
IHU – HÁ RISCO DE DESERTIFICAÇÃO DO SEMI-ÁRIDO ?
M.M. – O agronegócio e muitas famílias agricultoras realizam

práticas
como queimadas e uso desenfreado de agrotóxicos, o que vem

causando
danos à fauna e à flora. Já existem extensões de áreas, como a do

município
de Gibués, no Piauí, que estão em processo de desertificação

devido
ao uso inadequado do solo. Segundo dados da Embrapa, 45% da

área da
vegetação da Caatinga já foi devastada. Portanto, isso é um sinal

de que
boa parte do solo está descoberta e exposta às chuvas, sol, e vento,

os
principais vetores da desertificação. Não existem programas ou

políticas
públicas voltadas para a revitalização de rios e riachos, nem de

reflorestamento.
Esses investimentos são de realização caras, mas é necessário
avançar nos trabalhos educativos de preservação. No campo

jurídico
existe uma boa legislação de preservação ambiental, mas não há

punição.
IHU – COMO A AGROECOLOGIA TEM SIDO

DESENVOLVIDA NO SEMI-ÁRIDO ?
EM QUE MEDIDA CONTRIBUI PARA O

DESENVOLVIMENTO HUMANO E SUSTENTÁ-
VEL DAS FAMÍLIAS AGRICULTORAS DA REGIÃO?
M. M. – A agroecologia é um movimento crescente. Mas precisa de

mais
apoio governamental na implementação da Política Nacional de

Assistência
Técnica e Extensão Rural para que os técnicos possam apoiar as
famílias campesinas rumo a uma agricultura menos danosa e mais

autosustentável.
Quando se discute agroecologia, a família tem que estar envolvida,
valorizando o papel e conhecimento dos jovens, das mulheres,
dos homens e também o conhecimento do técnico. É nesse

intercâmbio de
informações que se processa um novo conhecimento. Nele, o

agroecossistema
é percebido de forma sistêmica: todos os sistemas de criação de
animais, cultivos, frutíferas e hortaliças se integram através da

biodiversidade;
cada sistema auxilia o outro. A agroecologia já tem suas raízes

fincadas
nas famílias do Semi-árido via processos construídos,

sistematizados
e socializados para as mídias televisivas, radiofônicas, blogs, redes

de
organizações. Até o governo está começando a se interessar.
IHU – EM QUE CONSISTE A PROPOSTA DE IMPLANTAR

SISTEMAS AGROFLORESTAIS
COMO ALTERNATIVA SUSTENTÁVEL DE PRODUÇÃO NO

SEMI-ÁRIDO ?
M.M.– O sistema agroflorestal é uma das propostas das entidades

que
desenvolvem o trabalho agroecológico. Trata-se de um cultivo

diversificado
que preserva as árvores nativas cujas podas permitem a entrada de

luz
natural. Assim, pode-se cultivar frutíferas, hortaliças, plantas

medicinais,
roçados, capins, enfim, plantas que possuem simbiose e que

possam
compartilhar o mesmo espaço. Nesses sistemas, o solo fica

protegido e
mais nutrido, as famílias ampliam a diversidade de alimentos para

o consumo
e para os animais. Nessa forma de cultivo não se utiliza

queimadas,
e é abolido o uso de agrotóxicos. As famílias também desenvolvem

os
quintais produtivos, onde cultivam ao redor da casa,

complementando a
produção e a geração de renda.
IHU – QUAL A IMPORTÂNCIA DA CAATINGA NA

PRESERVAÇÃO DO SEMI-ÁRIDO?
M.M. – A Caatinga é um dos biomas mais complexos e ricos do

mundo, com
biodiversidade de plantas e animais que só existe no Brasil. Se bem

manejada,
a Caatinga fornece alimento para as famílias e para os animais, e

é fonte de
princípios fitoativos exclusivos para elaboração de remédios. Além

da beleza
e da capacidade de regeneração quando ocorrem as primeiras

chuvas.
IHU – QUAIS AS PRINCIPAIS REIVINDICAÇÕES DA

DECLARAÇÃO DO SEMI-ÁRIDO?
M.M. – Em Fortaleza, Ceará, representantes de mais de 300

organizações
governamentais e não governamentais discutiram e aprovaram a

Declaração
do Semi-árido , durante a 1ª Conferência Regional de

Desenvolvimento
Sustentável do Bioma Caatinga. O documento apresenta uma série

de compromissos
e algumas reivindicações importantes, como a inclusão do bioma
Caatinga como patrimônio nacional e a aprovação no Congresso

Nacional
da Política Nacional de Combate e Prevenção à Desertificação e

Mitigação
dos Efeitos da Seca. A Declaração foi apresentada nos eventos

paralelos da
Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento

Sustentável –
Rio+20. Uma das principais bandeiras é a universalização do

acesso à água.
Entre as ações pontuadas no documento estão o incentivo à

implantação de
sistemas agroflorestais como alternativa sustentável de produção,

a priorização
da agricultura familiar sustentável e o fomento a linhas de crédito
oficiais para atividades sustentáveis na Caatinga. ■
45% da área da vegetação da
Caatinga já foi devastada, expondo
o solo descoberto às chuvas, sol,
e vento, vetores da desertificação.
Márcio Moura – Graduado em Agronomia pela Faculdade de

Ciências
Agrárias de Araripina/Faciagra, agrônomo da ONG Caatinga e

coordenador
do Programa de Políticas Públicas. Artigo publicado pelo IHU
On-line do Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade

do Vale
do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.] e republicado

no
portal EcoDebate (10/07/2012).


20 R
E
C
U
R
S
O
S
H
Í
D
R
I
C
O
S PANTANAL
por Aldem Bourscheit
Estudo inédito englobando Brasil, Bolívia,
Paraguai e Argentina aponta áreas que precisam
de mais atenção para garantir a sobrevivência
da maior planície alagável do planeta,
de populações e de economias.
Aconservação da Bacia do rio
Paraguai (1) e a sobrevivência
do Pantanal estão ameaçadas, principalmente
pela degradação de
nascentes e barramento de rios que
fluem de áreas de planalto (Cerrado)
para a planície pantaneira.
Por isso, a inédita “Análise de Risco
Ecológico da Bacia do Rio Paraguai”
(2) lançada no Dia Mundial
das Áreas Úmidas (2 de fevereiro)
evidencia que metade da bacia
pantaneira está sob alto e médio
risco ambiental. E que 14%
dela necessitam ser protegidos
com urgência, por sua grande capacidade
de fornecer água e manter
os ciclos de cheias e vazantes
que dão vida ao Pantanal.
O estudo contou com mais de
30 especialistas dos quatro países
e exigiu três anos de esforços,
evidenciando também que
essas áreas (em vermelho e amarelo
no mapa) estão majoritariamente
em porções elevadas nas
bordas da bacia e são as maiores
fornecedoras de água à planície,
área que ainda apresenta
boas condições ecológicas.
nascentes e rios ameaçados
“Conhecendo a “saúde” do
Pantanal podemos nos antecipar
a problemas futuros, como
o das mudanças climáticas. Mas
a saúde pantaneira está ameaçada
por ações em curso, no
presente”, ressaltou Glauco Kimura,
coordenador interino do
Programa Água para a Vida do
WWF-Brasil.
As principais ameaças à Bacia
do rio Paraguai são o desmatamento
e o manejo inadequado
de terras para agropecuária,
causadores de erosões e sedimentação
de rios. Barramentos
hidrelétricos também estão alterando
o regime hídrico natural
do Pantanal. O crescimento urbano
e populacional é seguido
por mais obras de infraestrutura,
como rodovias, barragens,
portos e hidrovias, colocando
em risco o frágil equilíbrio ambiental
pantaneiro.
Essas ameaças interagem em
conjunto ou isoladamente em
cada região mais crítica analisada:
cabeceiras e tributários no
Cerrado e Bosque Chiquitano
brasileiros; Mata Atlântica da
Bacia do rio Paraguai; Eixo de
Desenvolvimento Salta/Jujuy; e
Puerto Suarez e vale do Tucavaca
(Bolívia).
Apenas 11% (ou 123.600km²) da
bacia estão protegidos de alguma
forma, e meros 5% (56.800km²) sob
proteção integral, em parques nacionais
ou estaduais e estações
ecológicas. Além disso, as mais de
170 áreas protegidas não estão
distribuídas de forma adequada
para proteger as regiões que mais
fornecem água, ou as mais ricas
em biodiversidade.
O estudo, realizado em parceria
pelo WWF, The Nature Conservancy
e Centro de Pesquisas do
Pantanal, com apoio do HSBC e
Caterpillar, é um forte alerta para
que países, estados e municípios
adotem uma agenda de redução
de riscos e revertam modelos
insustentáveis de desenvolvimento.
Não há mais espaço
para uma cultura de abundância
e de desperdício, como se
houvesse um estoque infinito
de florestas nativas para derrubar,
de água onde lançar poluentes
e de terras para minerar.
A Bacia do rio Paraguai e o Pantanal
não devem ser protegidos
apenas pelas incontáveis espécies
de animais e plantas lá abrigados,
pelas belezas e serviços
ambientais (3) que oferecem, mas
também porque da saúde regional
dependem mais de oito milhões
de pessoas e economias
hoje focadas em 30 milhões de
cabeças de gado e quase 7 milhões
de hectares plantados, área
equivalente a um terço do estado
de São Paulo.
RECOMENDAÇÕES
O Pantanal, além de ser um abrigo
natural de espécies e mantenedor
de populações e economias,
também é uma preciosa
reserva estratégica de água
doce, ainda mais importante
frente ao futuro incerto das mudanças
climáticas.
Logo, alterar modelos de desenvolvimento
e criar mais áreas
protegidas (públicas e privadas),
especialmente em regiões de ca-
Cidadania&MeioAmbiente 21
REFERÊNCIAS
(1) O rio Paraguai nasce na região de Diamantino (MT) e

percorre 2,6 mil
quilômetros até encontrar o Rio Paraná, já em Corrientes

(Argentina). Sua
bacia cobre 1,2 milhão de quilômetros quadrados em quatro

países, área com
quase o tamanho do estado do Pará e altamente diversificada em

termos de
ecossistemas e de realidades socioeconômicas.
(2) A avaliação dos riscos ecológicos de uma bacia hidrográfica é

essencial para se
estimar sua capacidade de recuperação frente aos impactos

esperados do aquecimento
global, pois algumas ameaças poderão ganhar força em

detrimento de
outras. Além disso, ecossistemas naturais, atividades econômicas,

cidades e pessoas,
todos estão vulneráveis às mudanças climáticas eu maior ou

menor grau. Esse
estudo justamente visa compreender quais são os riscos atuais aos

ecossistemas
aquáticos da Bacia do Paraguai e como podemos nos preparar a

um futuro de
incertezas.
(3) A Embrapa estimou (2008) em US$112 bilhões por ano os

serviços
ambientais prestados gratuitamente pelo Pantanal. Logo, vale

muito mais
manter a região preservada do que zoneá-la com agropecuária,

cujo lucro
estimado seria de apenas US$ 414 milhões anuais.
Aldem Bourscheit – Analista de Comunicação / Programa Cerrado

Pantanal
na WWF-Brasil. Mapas e fotos em Análise de Risco Ecológico da
Bacia do Paraguai (Argentina, Bolívia, Brasil e Paraguai),janeiro

de 2012,
WWF Brasil /LEP. Este relatório pode ser baixado em

formato.PDF em
h t t p : / / d 3 n e h c 6 y l 9 q z o 4 . c l o u d f r o n t . n e t / d o w

n l o a d s /
26jan12_tnc_wwf_analise_de_risco_portugues.pdf
beceiras, são ações inteligentes
e estratégicas para os quatro
países responsáveis por sua
manutenção, bem como desenvolver
uma agenda de adaptação
da bacia às alterações do clima.
A pecuária extensiva precisa de
maior apoio técnico e econômico
para que melhores práticas cheguem
aos produtores, como conservação
de água e solo, manejo
e recuperação de pastagens e integração
lavoura-pecuária. “O
plantio direto na palha é uma boa
alternativa, porque protege o solo
da chuva e dos ventos, mantendo-
o mais rico e produtivo. Mesmo
assim, persiste o uso extensivo
de agrotóxicos em culturas
como a da soja, venenos que chegam
aos rios que abastecem o
Pantanal”, comentou Kimura.
Além da agropecuária, a bacia
tem importantes áreas de mineração,
destacando-se regiões
andinas como a de Potosi (Bolívia),
de extração de gás natural,
na transição do Chaco para
os Andes, de ouro e diamantes,
no Mato Grosso, e ainda
de ferro, manganês e calcário,
no Mato Grosso do Sul.
No caso de hidrelétricas em operação,
o caminho é implantar
esquemas de operação que mantenham
os ciclos de cheias e
vazantes de modo semelhante
ao natural. Para barragens em
planejamento, é necessário avaliar
seus impactos cumulativos
nos rios e na bacia, apontando
quais áreas poderão ou não arcar
com esses custos ambientais
sem prejudicar o Pantanal.
“Barramentos ameaçam a duração
e a intensidade dos ciclos
de cheias e vazantes, colocando
em cheque a vida, economias e
populações que dependem do
equilíbrio ecológico do Pantanal.
Reservatórios alteram a circulação
de nutrientes as emissões
de gases de efeito estufa, parâmetros
que precisam ser mais
bem dimensionados”, desta Albano
Araújo, coordenador da Estratégia
de Água Doce do Programa
de Conservação da Mata
Atlântica e das Savanas Centrais
da The Nature Conservancy. ■
Mapeamento das alterações da cobertura
Porção Brasileira. Período de Análise: 2002 a 2008. ©

WWF-Brasil
vegetal e uso do solo na Bacia do Alto Paraguai
WWF/Brasil Sérgio Amaral
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Aexuberância natural, a alta diversida
de biológica e a imensa planície de
áreas alagáveis do Pantanal Matogrossense
podem ser ameaçadas pelos impactos
nos recursos hídricos do Cerrado.
Os principais rios do Pantanal nascem nos
planaltos e nas chapadas do Cerrado. Estudos
realizados por pesquisadores da Embrapa
Cerrados (Planaltina-DF) concluíram que
o Cerrado contribui com a vazão que flui em
oito das 12 regiões hidrográficas brasileiras,
sendo fundamental para os rios Paraguai, Parnaíba,
São Francisco e Tocantins-Araguaia.
Na porção brasileira da região hidrográfica
do rio Paraguai, o Cerrado está presente em
62% de sua área e responde por quase 136%
da vazão nela produzida. Com essa estimativa,
fica evidente a dependência do Pantanal
em relação aos recursos hídricos gerados
no Cerrado. Isso porque a vazão, que cruza
os limites do Cerrado em direção ao Pantanal,
é aproximadamente 35% maior do que a
vazão que deixa o Brasil pelo rio Paraguai.
DÉFICIT HÍDRICO – Os pesquisadores Jorge
Furquim Enoch Werneck Lima e Euzebio
Medrado da Silva observaram que o
balanço hídrico do Pantanal é negativo em
relação à geração de vazão. Isso significa
que a evapotranspiração (total de água
perdida para a atmosfera) em sua área é
superior a precipitação, provocando inclusive,
o consumo de parte dos recursos hídricos
superficiais provenientes do bioma
Cerrado. Ou seja, no restante da bacia hidrográfica,
não ocupada por Cerrado, a
evapotranspiração é muito superior ao to-
Fonte: Embrapa Cerrados. Texto originalmente
publicado pela Rede Cerrado [http://
redecerrado.blogspot.com/] e no portal
EcoDebate (07/03/2008).
dependente das águas
tal precipitado na forma de chuva, provocando
um grande déficit hídrico.
É como se toda a precipitação nessa área
fosse “consumida” pela evapotranspiração
e, ainda, necessitasse de 35% a mais dos
recursos hídricos superficiais vindos do
Cerrado para suprir essa deficiência.
Dessa forma, o Pantanal, que fica na parte
mais baixa da região hidrográfica do Paraguai,
funciona como um vasto reservatório raso e
como grande espelho d’água, contribuindo
de maneira significativa com a “perda” de água
para a atmosfera por evaporação.
CLIMA DE SEMI-ÁRIDO – O déficit hídrico
também ocorre na região hidrográfica do
rio Parnaíba. Nessa região, o Cerrado está
presente em aproximadamente 66% de sua
área e gera cerca de 106% da vazão média
que o rio Parnaíba lança no oceano.
O balanço hídrico negativo existe em função
do total precipitado, nas áreas não ocupadas
pelo Cerrado, ser inferior ao total evapotranspirado.
Uma das razões para que isso aconteça
é que grande parte do restante dessa
região constitui área de clima Semi-árido.
Na bacia do rio São Francisco, o Cerrado
contribui com 94% da vazão e na região
hidrográfica Tocantins-Araguaia com quase
71% da vazão que flui em seus rios. As
12 bacias hidrográficas em que a contribuição
hídrica do Cerrado foram analisadas
são Amazônica, Tocantins-Araguaia,
Atlântico Nordeste Ocidental, Parnaíba,
São Francisco, Atlântico Leste, Paraná,
Paraguai, Atlântico Nordeste Oriental,
Atlântico Sudeste, Uruguai e Atlântico Sul.
Sendo a área do Cerrado uma região com
cabeceiras de bacias hidrográficas é fundamental
a ampliação dos conhecimentos referentes
ao seu comportamento hidrológico e
aos impactos sobre seus recursos hídricos.
Além da importância em termos hidrológicos,
o Cerrado possui enorme destaque no
cenário agrícola. Conta com 61 milhões de
hectares de pastagens cultivadas, 14 milhões
de hectares de culturas anuais, 3,5
milhões de hectares de culturas perenes e
florestais, além de ser responsável por 55%
da produção nacional de carne bovina.
Os pesquisadores da Embrapa Cerrados –
unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária, vinculada ao Ministério
da Agricultura, Pecuária e Abastecimentochamam
atenção para a necessidade da
ocupação do Cerrado ocorra sob base sustentáveis,
gerando o máximo de benefícios
com o mínimo de impactos.
Para isso é fundamental a existência de dados
e informações técnicas sobre a região para
subsidiar a tomada de decisão pelas instituições
envolvidas no processo de aproveitamento
e gestão de seus recursos naturais.■
Pantanal:
do Cerrado
por Embrapa Cerrados
WWF/Brasil Sérgio Amaral
Cidadania&MeioAmbiente 23
24
Terra,
R E F L E X Ã O
por Carlos Leonardo Figueiredo Gomes
Imagino a emoção de Gagárin ao ver pela
primeira vez, do espaço, nosso planeta
como uma bola azul, matizada com nuvens
brancas sobre um fundo escuro, solta
no espaço, sem nada para segurá-la, presa
apenas pelas forças invisíveis que mantêm
todo universo em harmonia, como a gravidade
a centrífuga, e etc. “A Terra é azul!” Ele
exclamou. E como ela, ele também em sua
nave, estava solto e a “vagar” pelo universo.
“Em algum canto afastado do universo estendido no resplendor de

inumeráveis
sistemas solares, houve uma vez uma estrela sobre o qual animais

inteligentes
inventaram o conhecimento. Foi o minuto de maior arrogância e o

mais mentiroso
da história universal: mas foi só um minuto. Apenas alguns

suspiros da
natureza e a estrela se congelou, os animais inteligentes tiveram

que morrer.”
Nietzsche, “Introdução teorética sobre a verdade e a mentira num

sentido extranormal”1
nossa morada no Universo
Poucos de nós se atêm a alguns aspectos
importantes quando falamos do planeta
Terra e sua real importância para nós como
nossa morada no universo.
TERRA: UM COLOSSO ESGOTÁVEL
Imaginamos a Terra como um lugar imenso
que pode nos prover de todas as nossas
necessidades. Afinal, nosso planeta, em
números redondos, possui aproximadamente
4,5 bilhões de anos, mede cerca de 40.mil
km de circunferência, possui mais de 12 mil
km de diâmetro no equador, pesa mais de 6
sextilhões de toneladas, com uma área de
mais de 510 milhões km2, sendo 150 milhões
km2 de terras emersas, equivalendo a 30%
do total, e os restantes, 360 milhões km2,
equivalentes a 70% do total, de mares e
oceanos, com profundidades médias de
aproximadamente 4 mil metros, quase inex-
Zipckr
plorados, e isso tudo, viajando pelo espaço,
em órbita do sol, numa velocidade espantosa
de quase 30km por segundo, ou
seja, mais de 107 mil km por hora.
Além da superfície, onde vivemos, existem espaços
sob e sobre ela que nos propiciam condições
para explorar recursos necessários à
nossa sobrevivência. Assim, vemos que a estrutura
da Terra, além da mencionada superfície,
chamada de crosta, que vai a uma profundidade
de até 40km sob os oceanos a até 90km
nos continentes, possui ainda, além dela, um
manto, com matéria pastosa com mais de 2.900
km de espessura, composta de silício, ferro,
alumínio, magnésio, e um núcleo com matéria
incandescente formada por níquel e ferro. Como
se não bastasse, sobre a crosta, há uma camada
de ar composta de diversos gases, a atmosfera,
que vai até 1000km de altura, formada basicamente
de nitrogênio, oxigênio, argônio e
ainda inúmeros outros gases.
Vivendo nessa estrutura fantástica, existem
cerca de quase 9 milhões de espécies vivas,
e pasmem, há mais desse tanto a ser
descoberta segundo algumas previsões, e
segundo outras, nossas espécies poderão
chegar a 30 milhões.
Tudo isso nos deu, pelos menos até há pouco
tempo, uma ideia de que o nosso planeta
possui uma fonte inesgotável de suprimentos,
que poderia nos abastecer eternamente.
Aliás, a maioria das pessoas ainda ve a Terra
como fonte inesgotável e eterna, fruto de um
pensamento gerado numa cultura que ainda
não desenvolveu uma mentalidade ambiental,
no sentido de ver nossas limitações.
A síndrome da inesgotabilidade do planeta
Sob esse aspecto, nossa situação é preocupante,
pois, grande parte da população mundial,
mesmo que inconsciente, ainda vê o
nosso mundo como um lugar de abundância
infinita. Por isso, uma das principais preocupações
quando se fala em meio ambiente, é
justamente sobre a inesgotabilidade do planeta.
Ou seja, a ilusão de que é inesgotável e
a realidade de que é esgotável, gerando nas
pessoas, o que se poderia chamar de “síndrome
da inesgotabilidade do planeta”.
Dois fatores ou crenças, de origem histórica,
agravam esse fato que denominei de “síndrome
da inesgotabilidade do planeta”.
O PRIMEIRO é o de que, através dos tempos,
o ser humano tem se mostrado altamente
Grande parte da
população mundial
ainda vê a Terra
como um planeta
de abundância
inesgotável.
capaz em superar dificuldades, e sempre que
surge um grande problema, ele encontra
uma solução. Cria máquinas, inventa remédios,
métodos de trabalho, supera pestes,
doenças, catástrofes das mais diversas, faz
guerra devastadoras e atenua suas consequências.
Para isso, inventou inúmeras ciências
e especialidades, fazendo com que o
homem por si e entre si passasse a conviver,
apesar das vicissitudes, com maior segurança.
Ele tende a superar tudo numa
velocidade assustadora. E assim, essa crença
que pode resolver tudo invade o pensamento
humano em todas as esferas; só que
quanto ao meio ambiente ele pode se decepcionar.
O animal inteligente, esse mesmo
que inventou o conhecimento pode extinguir-
se a si mesmo, pois, ele vive num
processo de suicídio coletivo, por inércia e
confiança inconsciente em suas potencialidades
técnicas e científicas, acreditando
que não importa o problema que há de vir,
ele, o ser humano o resolverá.
O SEGUNDO é baseado na crença de que existe
um lugar para a humanidade se refugiar
em caso de uma grande catástrofe. Também,
pudera, nossos antepassados sempre procuraram
novos mundos. Navegadores e desbravadores
atingiram seus quatro cantos, e
por isso, a história inseriu em cada ser humano
essa crença: de que existe um novo mundo,
nem que seja no interior da terra, no fundo
do mar ou no espaço sideral. De certo
que existem lugares dos mais diversos; o
Universo é infinito, mas não é descartável.
As consequências por acreditar que o planeta
é inesgotável são gravíssimas, principalmente
por que incrementa o uso não
sustentado do mesmo, e assim, vemos que
nós, os humanos, temos sido o seu maior
destruidor. Salta aos olhos os impactos negativos
que a humanidade exerce sobre o
planeta. Milhões de toneladas de lixo são
produzidas a cada ano. A poluição das águas,
através dos rios, lagos e mares são crescentes;
a poluição do ar tem causado o efeito
estufa, que por sua vez, aumenta o aquecimento
global e provoca o degelo nos polos.
O aumento da erosão vem causando
desertificação em inúmeros lugares no planeta,
e, sem citar todo tipo de agressividade
ambiental provocada pelo homem, podemos
incluir ainda, a poluição sonora, a
poluição visual e a poluição eletromagnética,
e, em vista disso tudo, milhares de espécies
são extintas todo ano.
Não é objetivo deste trabalho adentrar por
demais nesse tema específico, mas, se analisarmos,
por exemplo, somente a questão
da água, este texto poderá ser classificado
como escatológico.
ÁGUA: RECURSO EM ESCASSEZ
Com referência a água, e, com relação a ela,
sabemos que apesar de ocupar 75% do planeta,
somente cerca de 0,6%, ou seja, menos
de 1% é doce. Não bastasse sua escassez,
somente 0,1% é potável. O restante,
97,3% é salgado e está nos oceanos, os
outros restantes 2%, congelada nos polos.
Só estes dados sobre a água, a bem pensar,
nos dá certa insegurança sobre o nosso futuro.
Há um aumento enorme na população
que exige maior consumo da mesma em todos
os níveis. Imaginem, por exemplo, a quantidade
de água usada na agricultura, na indústria
e no uso doméstico, etc.
Todavia, observando as estatísticas também
de outros elementos ambientais, sem
qualquer esforço verificamos que em vista
do crescimento desordenado da população,
que reclama mais e mais do uso do planeta,
as coisas tendem a se agravar.
A QUESTÃO DEMOGRÁFICA
Desde há muito, o homem tem se preocupado
com o aumento da população. No século
18, por exemplo, o economista inglês,
Robert T. Malthus, afirmou que a desproporção
da produção de alimentos e o aumento
da população, causariam a pobreza
crescente e a fome permanente. Malthus foi
amplamente criticado, pois ignorou a estrutura
social e econômica e as possibilidades
criadas pela tecnologia agrícola.
No entanto, a pobreza e a fome têm aumentado
e muito em nosso planeta. Se Malthus
esqueceu-se do desenvolvimento tecnoló-


26
REFERÊNCIAS
1 - Citado por: GUEDEZ, Annie. Foucault, Melhoramentos,
Ed. Universidade de São Paulo, São
Paulo, 1977.
2 - Círculo do Livro, 1992.
3 - Usei esse experimento em sala de aula, quando
ia falar sobre consciência do meio ambiente.
A humanidade
vive um processo
de suicídio coletivo
por inércia
e confiança em suas
potencialidades
técnicas e científicas
que tudo resolvem.
gico, seus críticos esqueceram-se do egoísmo
humano, dá má utilização da tecnologia,
da corrupção e dos interesses políticos,
dentre outros, e por outros caminhos,
parte de sua previsão está acontecendo, o
aumento da pobreza e da fome.
E é nesse contexto que o animal inteligente,
o homem encontra-se hoje. Apesar do desenvolvimento
tecnológico e científico, a
corrupção e o modelo de educação que usamos
nos faz aceitar a existência de povos
vivendo na pobreza extrema, que não têm
água e nem o que comer. E as expectativas
para o futuro, baseados no estilo de vida
atual, é que pode faltar água daqui a alguns
anos para mais e mais pessoas, e atrás disso
virá doenças, fome e outras desgraças. Tudo
causado pelo próprio homem. Parece inacreditável,
a bola azul, matizada com nuvens
brancas, solta no espaço, que é o lar, a morada,
a casa, do animal inteligente, o homem,
pode tornar-se, em breve, um lugar inóspito
para a humanidade.
Educação: chave para o viver sustentável
Na verdade, o ser humano sabe que os problemas
com o meio ambiente devem ser prevenidos
e não remediados, e a prevenção só é possível
pela educação. Daí, o único remédio para
a “síndrome da inesgotabilidade” é o trabalho
educativo, que disciplinará o consumo, e
provocará a sustentabilidade em sua existência
em todos os aspectos, promovendo uma
verdadeira conscientização planetária. A educação
fará com que o homem viva desde o
nascimento até a morte de maneira sustentável;
e esta será a palavra do século, a senha da
vida e deve ser despertada desde tenra idade,
e em todas as instituições humanas.
Só que nesse aspecto, o homem também
sabe que a educação depende de vontade
política, de um verdadeiro compromisso, o
que não tem acontecido, pois, o que se vê
em matéria educativa relacionada ao meio
ambiente, são discursos demagógicos com
propagandas na mídia, que são insuficientes
para suprir todo aparato educativo em
assunto de tal natureza.
Procuram fazer leis que não atendem as necessidades
de proteção do planeta; assinam
tratados, convenções e outros documentos
de cunho econômico onde o meio ambiente
é mencionado, e os nomeiam como documentos
ambientais. Na verdade os governos
cumprem metas. Com tanto “barulho”,
querem se justificar para a posteridade…
UMA ARCA DE NOÉ SIDERAL?
A título de ilustração, e apenas para fazer
uma conexão com nossa condição de existência
no universo, e, numa hipótese de ter
que desocupar o planeta, até mesmo por pressão
do crescimento demográfico, dentre outras,
recorro a Isaac Azimov. Ele nos informa
em seu “Vida Extraterrena2”, livro científico
na área de astrobiologia, as dificuldades de
uma possível viagem interestelar, que demorariam
milhares de anos. Contudo, após análise
de muitas possibilidades, ele sugeriu o
uso de uma nave imensa, uma colônia espacial,
que utilizaria energia retirada do hidrogênio
e viajaria com toda sua estrutura, que
incluiria o solo, a água, ar, plantas, animais e
pessoas, rumo ao desconhecido. Os colonos
não estariam deixando suas casas, mas
levando elas consigo e constituiriam um
mundo independente.
Nesse contexto, podemos facilmente imaginar
que tudo estaria limitado e a convivência
naquela colônia deveria obedecer a
regras rígidas, se não poderia haver um
caos. A viagem seria só de ida, todos os
tripulantes teriam conhecimento que a partir
daquele momento aquela nave seria sua
morada, deveriam cuidar dela de forma tão
metódica, tão cuidadosa, porque senão o
fim estaria próximo.
Em essência, a única diferença entre a nave
de Azimov e a Terra, seria sua rota. O planeta
Terra está viajando no espaço, obedecendo
a uma trajetória que nenhum de seus
tripulantes pode alterar, mas, até então segura,
pois de acordo com as leis universais
e inteligentes que regem o Todo.
Para que melhor entendamos esse aspecto
do nosso planeta como nosso lugar no Universo,
proponho que coloquemos nossa
imaginação para funcionar e façamos um
pequeno exercício psíquico, onde será necessário
evocar a imaginação. Faremos, pois,
uma viagem mental no espaço sideral3. Ao
ler as próximas linhas, pare a leitura em algum
trecho que considerar conveniente, feche
os olhos e sinta o momento ali descrito.
Sente-se em um local confortável. Imagine esse
local onde você está sentado sendo observado
do alto, de dois metros de altura. Você verá
a cadeira onde está sentado, as coisas em sua
volta. Suba mais, verá o teto da casa, e, à medida
que for subindo irá vendo cada vez mais
coisas, seu bairro, sua cidade, os contornos
do continente no mar, o planeta Terra como
uma bola azul. Suba mais, e verá cada vez mais
essa bola ir diminuindo, até se mostrar como
um grãozinho solto num imenso fundo negro e
desaparecer! É lá (aqui) que estamos agora,
neste exato momento, naquele (neste) grãozinho
que sumiu no espaço, infinito e escuro.
Tente sentir isso. Essa é nossa condição atual,
nossa condição nesse exato instante.
Pense bem nisso, estamos “vagando” por
um mar sem fim, absorto na escuridão, a
milhares de quilômetros por hora, a mercê
das leis que regem o universo. À primeira
vista, estamos sós, sozinhos soltos nesse
espetacular e desconhecido oceano sombrio,
a despeito dos grandes conhecimentos
que a humanidade conseguiu e vem
conseguindo sobre o universo.
Esta é a grande questão! Para onde iremos
quando nossos suprimentos acabarem? Nosso
mundo é como uma nave à deriva, não
podemos guiá-la. Aliás, o capitão que deu sua
rota inicial e a mantém nela possui todos os
conhecimentos cartográficos e de navegação.
Nossa preocupação é uma só, cuidar de seu
meio para que possamos navegar pelo universo
e existir com dignidade. ■
Carlos Leonardo Figueiredo Gomes é ambientalista,
advogado, sociólogo, especialista em
ciências penais. Ensaio publicado no portal
EcoDebate (12/07/2012)


Cidadania&MeioAmbiente 27
28 C
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Educação Ambiental obrigatória:
por Eloy Cassagrande Jr.
A cidadania ambiental
vem sendo
desrespeitada,
com pouco espaço
para diálogo.
Educação se dá
pelo exemplo e
não por decreto!
ODiário Oficial da União, publicou no
dia 15 de junho, em meio a realização
da Rio+20, a resolução que estabelece as
“Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Ambiental”. De acordo com a
mesma, o “atributo ambiental na tradição
da Educação Ambiental brasileira e latino-
americana não é empregado para especificar
um tipo de educação, mas se constitui
em elemento estruturante que demarca
um campo político de valores e práticas,
mobilizando atores sociais comprometidos
com a prática político-pedagógica
transformadora e emancipatória capaz
de promover a ética e a cidadania ambiental”.
Destaco aqui o termo “cidadania ambiental”,
pouco exercida durante na Rio+20, cujo
documento final oficial foi duramente criticado
pela sociedade civil organizada, que
pediu para que se retirasse o termo “ampla
participação da sociedade civil”. A nova
lei evidencia a necessidade da
transversalidade como forma de valorizar a
pluralidade e as diferenças individuais, sociais,
étnicas e culturais dos estudantes,
promovendo valores de cooperação, de relações
solidárias e de respeito ao meio ambiente.
No entanto, ambientalistas têm demonstrado
sua insatisfação com a postura
do governo brasileiro em relação à construção
da usina hidrelétrica de Belo Monte,
que recebe duras críticas internacionais, a
aprovação do Código Florestal que enfraquece
a proteção da nossa biodiversidade,
a isenção de IPI para automóveis poluentes,
entre outras. A cidadania ambiental aqui
vem sendo claramente desrespeitada, como
pouco espaço para diálogo.
Resoluções como estas – de tornar obrigatório
os conhecimentos dos problemas socioambientais,
assim como as propostas de
soluções – se arrastam desde a Lei nº 6.938,
de 31 de agosto de 1981, que dispõe sobre a
Política Nacional do Meio Ambiente, que já
estabelecia que a educação ambiental deveria
ser ministrada a todos os níveis de ensino,
objetivando capacitá-la para a participação
ativa na defesa do meio ambiente. Na
nova resolução vemos frases de efeito como
“O reconhecimento do papel transformador
e emancipatório da Educação Ambiental
torna-se cada vez mais visível diante do
atual contexto nacional e mundial em que
a preocupação com as mudanças climáticas,
a degradação da natureza, a redução
da biodiversidade, os riscos socioambientais
locais e globais, as necessidades planetárias
evidencia-se na prática social.”
A educação se dá pelo exemplo e não por decreto!
Assim como governos anteriores, o da
presidente Dilma Rousseff ainda não assumiu
o compromisso de proteção do meio ambiente
e nem com a educação de qualidade, tendo em
vista que mais de cinqüenta universidades federais
estão em greve por melhores salários
para os professores, reestruturação do plano
de carreira e condições de trabalho.
Numa política clara que estimula o consumo
desenfreado, levando ao endividamento e à
inadimplência milhares de brasileiros, o governo
demonstra sua incoerência ao tratar da
questão ambiental. Quanto mais consumismo,
mais uso de recursos naturais não renováveis
e de energia, conseqüentemente, mais
poluição e degradação ambiental. Matemática
simples que não bate com lógica da preservação!
Concluí-se, assim, que os dois termos
“educação” e “ambiental”, ainda estão sem
interação e que não podem ser sustentados
somente por discursos e retóricas.
O lado bom da resolução é que esta deverá
provocar o debate interno nas instituições
de ensino, onde se espera que professores e
administradores estabeleçam medidas necessárias
para mudanças nas grades curriculares
defasadas com a questão ambiental. Preocupação
maior está no ensino superior,
onde ainda predomina o ensino tecnológico
“duro”, onde o foco é a produtividade.
O cenário poderia ser melhor se nossos líderes
mundiais tivessem assinado o documento da
Rio+20, com metas estabelecidas e comprometimentos.
Infelizmente, perdemos mais uma
oportunidade do exemplo que educa! ■
Prof. Dr. Eloy F. Cassagrande Jr., Coordenador
do Escritório Verde da Universidade Tecnológica
Federal do Paraná (UTFPR). Publicado
no portal EcoDebate (03/07/2012).
um Brasil mais sustentável?
Cidadania&MeioAmbiente 28
Manu Dias-SECOM
L E G I S L A Ç Ã O A M B I E N T A L
para o veto total
por André Lima, Raul Valle e Tasso Azevedo
Este texto reflete exame minucioso do Projeto de Lei 1876/99,

revisado
pela Câmara dos Deputados, à luz dos compromissos da

Presidenta
Dilma Rousseff assumidos em sua campanha nas eleições de 2010.
Para cumprir seu compromisso de campanha
e não permitir incentivos a mais
desmatamentos, redução de área de
preservação e anistia a crimes ambientais, a
Presidenta Dilma terá que reverter ou recuperar,
no mínimo, os dispositivos identificados
abaixo. No entanto, a maioria dos dispositivos
são irreversíveis ou irrecuperáveis
por meio de veto parcial.
13 razões
ao Código Florestal
A hipótese de vetos pontuais a alguns ou
mesmo a todos os dispositivos aqui comentados,
além de não resolver os problemas
centrais colocados por cada dispositivo
(aprovado ou rejeitado), terá como efeito a
entrada em vigor de uma legislação despida
de clareza, de objetivos, de razoabilidade,
de proporcionalidade e de justiça social.
Vulnerável, pois, ao provável questionamento
de sua constitucionalidade. Além
disso, deixará um vazio de proteção em temas
sensíveis como as veredas na região
de cerrado e os mangues.
Para preencher os vazios fala-se da alternativa
de uma Medida Provisória concomitante
com a mensagem de veto parcial. Porém esta
não é uma solução, pois devolve à bancada
Sam Beebe/Ecotrust
Cidadania&MeioAmbiente 29
30
ruralista e à base rebelde na Câmara
dos Deputados o poder final de decidir
novamente sobre a mesma matéria.
A Câmara dos Deputados infelizmente
já demonstrou por duas vezes
– em menos de um ano – não ter compromisso
e responsabilidade para com
o código florestal. Partidos da base
do governo como o PSD, PR, PP, PTB,
PDT capitaneados pelo PMDB, elegeram
o código florestal como a
“questão de honra” para derrotar politicamente
o governo por razões exóticas
à matéria.
Seja por não atender ao interesse público
nacional por uma legislação que
salvaguarde o equilíbrio ecológico, o
uso sustentável dos recursos naturais
e a justiça social, seja por ferir frontalmente
os princípios do desenvolvimento
sustentável, da função social
da propriedade rural, da precaução, do
interesse público, da razoabilidade e
proporcionalidade, da isonomia e da
proibição de retrocesso em matéria de
direitos sociais, o texto aprovado na
Câmara dos Deputados merece ser
vetado na íntegra pela Presidenta da
República.
Ato contínuo deve ser constituída
uma força tarefa para elaborar uma
proposta de Política Florestal ampla
para o Brasil a ser apresentada no
Senado Federal e que substitua o atual
código florestal elevando o grau
de conservação das florestas e ampliando
de forma decisiva as oportunidades
para aqueles que desejam fazer prosperar
no Brasil uma atividade rural sustentável
que nos dê orgulho não só do que produzimos,
mas da forma como produzimos.
Enquanto esta nova lei é criada, é plenamente
possível por meio da legislação vigente
e de regulamentos (decretos e resoluções
do CONAMA) o estabelecimento de
mecanismos de viabilizem a regularização
ambiental e a atividade agropecuária, principalmente
dos pequenos produtores rurais.
13 RAZÕES PARA O VETO TOTAL
1. SUPRESSÃO DO ARTIGO PRIMEIRO DO TEXTO
APROVADO PELO SENADO QUE ESTABELECIA OS
PRINCÍPIOS JURÍDICOS DE INTERPRETAÇÃO DA
LEI QUE LHE GARANTIA A ESSÊNCIA AMBIENTAL
NO CASO DE CONTROVÉRSIAS JUDICIAIS OU
ADMINISTRATIVAS. Sem esse dispositivo, e
considerando-se todos os demais problemas
abaixo elencados neste texto, fica explícito
que o propósito da lei é simplesmente consolidar
atividades agropecuárias ilegais em
áreas ambientalmente sensíveis, ou seja, uma
lei de anistia florestal. Não há como sanar a
supressão desses princípios pelo veto.
2. UTILIZAÇÃO DE CONCEITO INCERTO E GENÉ-
RICO DE POUSIO E SUPRESSÃO DO CONCEITO DE
ÁREAS ABANDONADAS E SUBUTILIZADAS. Ao definir
pousio como período de não cultivo (em
tese para descanso do solo) sem limite de
tempo (Art. 3 inciso XI), o projeto permitirá
novos desmatamentos em áreas de preservação
(encostas, nascentes etc.) sob a alegação
de que uma floresta em regeneração
(por vezes há 10 anos ou mais) é, na verdade,
uma área agrícola “em descanso”. Associado
ao fato de que o conceito de áreas
abandonadas ou subutilizadas, previsto
tanto na legislação hoje em vigor
como no texto do Senado, foi deliberadamente
suprimido, teremos um duro
golpe na democratização do acesso e
da terra, pois áreas mal-utilizadas, possuídas
apenas para fins especulativos,
serão do dia para a noite terras “produtivas
em descanso”. Essa brecha
enorme para novos desmatamentos
não pode ser resolvida com veto.
3. DISPENSA DE PROTEÇÃO DE 50 METROS
NO ENTORNO DE VEREDAS (INCISO
XI DO ART. 4º ART). Isso significa a
consolidação de ocupações ilegalmente
feitas nessas áreas como também
novos desmatamentos no entorno
das veredas hoje protegidas. Pelo
texto aprovado, embora as veredas
continuem sendo consideradas área
de preservação, elas estarão na prática
desprotegidas, pois seu entorno
imediato estará sujeito a desmatamento,
assoreamento e possivelmente a
contaminação com agroquímicos.
Sendo as veredas uma das principais
fontes de água do Cerrado, o prejuízo
é enorme, e não é sanável pelo veto
presidencial.
4. DESPROTEÇÃO ÀS ÁREAS ÚMIDAS BRASILEIRAS.
Com a mudança na forma de cálculo
das áreas de preservação ao longo
dos rios (art.4o), o projeto deixa desprotegidos,
segundo cálculos do Instituto
Nacional de Pesquisas da Amazônia
(INPA), 400 mil km2 de várzeas e
igapós. Isso permitirá que esses ecossistemas
riquíssimos possam ser ocupados
por atividades agropecuárias intensivas, afetando
não só a biodiversidade como a sobrevivência
de centenas de milhares de famílias
que delas fazem uso sustentável.
5. AUMENTO DAS POSSIBILIDADES LEGAIS DE
NOVOS DESMATAMENTOS EM APP – O novo
texto (no §6º do Art4o) autoriza novos desmatamentos
indiscriminadamente em APP
para implantação de projetos de aquicultura
em propriedades com até 15 módulos fiscais
(na Amazônia, propriedades com até
1500ha – na Mata Atlântica propriedades
com mais de mil hectares) e altera a definição
das áreas de topo de morro reduzindo
significativamente a sua área de aplicação
(art.4º, IX). Em nenhum dos dois casos o
Veto pode reverter o estrago que a nova Lei
irá causar, ampliando as áreas de desmata
Simon Chirgwin
No texto fica explícito que o
propósito da lei é simplesmente
consolidar as atividades
agropecuárias ilegais em áreas
ambientalmente sensíveis, ou seja,
uma lei de anistia florestal.


mento em áreas sensíveis.
6. AMPLIAÇÃO DE FORMA AMPLA E INDISCRIMINADA
DO DESMATAMENTO E
OCUPAÇÃO NOS MANGUEZAIS ao separar
os Apicuns e Salgados do conceito
de manguezal e ao delegar o
poder de ampliar e legalizar ocupações
nesses espaços aos Zoneamentos
Estaduais, sem qualquer restrição
objetiva (§§ 5º e 6º do art. 12). Os
estados terão amplos poderes para
legalizar e liberar novas ocupações
nessas áreas. Resultado: enorme risco
de significativa perda de área de
manguezais, que são cruciais para
conservação da biodiversidade e
produção marinha na zona costeira.
Não tem como resgatar pelo Veto as
condições objetivas para ocupação
parcial desses espaços, tampouco o
conceito de manguezal que inclui apicuns
e salgados.
7. PERMITE QUE A RESERVA LEGAL NA
AMAZÔNIA SEJA DIMINUÍDA MESMO PARA
DESMATAMENTOS FUTUROS ao não estabelecer,
no art. 14, um limite temporal
para que o Zoneamento Ecológico Econômico
autorize a redução de 80% para
50% do imóvel. A lei atual já traz essa
deficiência, que incentiva que desmatamentos
ilegais sejam feitos na expectativa
de que zoneamentos futuros venham
legalizá-los, e o projeto não resolve
o problema.
8. DISPENSA DE RECOMPOSIÇÃO DE APPS.
O texto revisado pela Câmara ressuscita
a emenda 164 (aprovada na primeira
votação na Câmara dos Deputados, contra a
orientação do governo) que consolida todas
as ocupações agropecuárias existentes
às margens dos rios, algo que a ciência brasileira
vem reiteradamente dizendo ser um
equívoco gigantesco. Apesar de prever a
obrigatoriedade de recomposição mínima de
15 metros para rios inferiores a 10 metros de
largura, fica em aberto a obrigatoriedade de
recomposição de APPs de rios maiores, o
que gera não só um possível paradoxo (só
partes dos rios seriam protegidas), como abre
uma lacuna jurídica imensa, a qual só poderá
ser resolvida por via judicial, aumentando a
tão indesejada insegurança jurídica. O fim
da obrigação de recuperação do dano ambiental
promovida pelo projeto condenará mais
de 70% das bacias hidrográficas da Mata
Atlântica, as quais já têm mais de 85% de
sua vegetação nativa desmatada. Ademais,
embora a alegação seja legalizar áreas que já
estavam “em produção” antes de supostas
mudanças nos limites legais, o projeto anistia
todos os desmatamentos feitos até 2008,
quando a última modificação legal foi em 1986.
Mistura-se, portanto, os que agiram de acordo
com a lei da época com os que deliberadamente
desmataram áreas protegidas apostando
na impunidade (que o projeto visa garantir).
Cria-se, assim, uma situação antiisonômica,
tanto por não fazer qualquer distinção
entre pequenos e grandes proprietários
em situação irregular, como por beneficiar
aqueles que desmataram ilegalmente em
detrimento dos proprietários que o fizeram
de forma legal ou mantiveram suas APPs conservadas.
É flagrante, portanto, a falta de razoabilidade
e proporcionalidade da norma
contida no artigo 62, e um retrocesso monumental
na proteção de nossas fontes de água.
9. CONSOLIDAÇÃO DE PECUÁRIA IMPRODUTIVA
EM ENCOSTAS, BORDAS DE CHAPADAS,
TOPOS DE MORROS E ÁREAS EM
ALTITUDE ACIMA DE 1800 METROS
(ART. 64) O QUE REPRESENTA UM GRAVE
PROBLEMA AMBIENTAL PRINCIPALMENTE
NA REGIÃO SUDESTE DO PAÍS
pela instabilidade das áreas (áreas
de risco), inadequação e improdutividade
dessas atividades nesses espaços.
No entanto, o veto pontual a
esse dispositivo inviabilizará atividades
menos impactantes com espécies
arbóreas perenes (café, maçã
dentre outras) em pequenas propriedades
rurais, hipóteses em que houve
algum consenso no debate no Senado.
O Veto parcial resolve o problema
ambiental das encostas no
entanto, não resolve o problema dos
pequenos produtores.
10. AUSÊNCIA DE MECANISMOS QUE
INDUZAM A REGULARIZAÇÃO AMBIENTAL
E PRIVILEGIEM O PRODUTOR QUE
PRESERVA EM RELAÇÃO AO QUE DEGRADA
OS RECURSOS NATURAIS. O projeto
revisado pela Câmara suprimiu o art.
78 do Senado, que vedava o acesso
ao crédito rural aos proprietários de
imóveis rurais não inscritos no Cadastro
Ambiental Rural – CAR após
5 anos da publicação da Lei. Retirou
também a regra que vedava o direcionamento
de subsídios econômicos
a produtores que tenham efetuado
desmatamentos ilegais posteriores a
julho de 2008. Com isso, não só não
haverá instrumentos que induzam a
adesão aos Programas de Regularização
Ambiental, como fica institucionalizado o
incentivo perverso, que premia quem descumpre
deliberadamente a lei. Propriedades
com novos desmatamentos ilegais poderão
aderir ao CAR e demandar incentivos para
recomposição futura. Somando-se ao fato
de que foi retirada a obrigatoriedade de publicidade
dos dados do CAR, este perde
muito de seu sentido. Um dos únicos aspectos
positivos de todo projeto foi mutilado.
Essa lacuna não é sanável pelo veto. A
lei perde um dos poucos ganhos potenciais
para a governança ambiental.
11. PERMITE QUE IMÓVEIS DE ATÉ 4 MÓDULOS
FISCAIS NÃO PRECISEM RECUPERAR SUA RESERVA
LEGAL (ART.68), ABRINDO BRECHAS PARA
UMA ISENÇÃO QUASE GENERALIZADA. Embora
os defensores do projeto argumentem que
O texto revisado pela Câmara
ressuscita a emenda 164
que consolida todas as
ocupações agropecuárias
existentes às margens dos rios...
um equívoco gigantesco.
Simon Chirgwin “

Cidadania&MeioAmbiente 31
32
esse dispositivo é para permitir
a sobrevivência de pequenos
agricultores, que não
poderiam abrir mão de áreas
produtivas para manter a reserva,
o texto não traz essa
flexibilização apenas aos
agricultores familiares, como
seria lógico e foi defendido
ao longo do processo legislativo
por organizações socioambientalistas
e camponesas.
Com isso, permite que
mesmo proprietários que tenham
vários imóveis menores
de 4 MF – e, portanto,
tenham terra mais que suficiente
para sua sobrevivência
– possam se isentar da
recuperação da RL. Ademais,
abre brechas para que
imóveis maiores do que esse
tamanho, mas com matrículas
desmembradas, se beneficiem
dessa isenção. Essa
isenção fará com que mais
de 90% dos imóveis do país
sejam dispensados de recuperar
suas reservas legais e
jogaria uma pá de cal no objetivo
de recuperação da
Mata Atlântica, pois, segundo
dados do Ipea, 67% do
passivo de reserva legal está
em áreas com até 4 módulos.
12. CRIA ABERTURA PARA
DISCUSSÕES JUDICIAIS INFINDÁVEIS
SOBRE A NECESSIDADE
DE RECUPERAÇÃO DA RL (ART.69). A pretexto
de deixar claro que aqueles que respeitaram
a área de reserva legal de acordo
com as regras vigentes à época estão
regulares, ou seja, não precisam recuperar
áreas caso ela tenha sido aumentada
posteriormente (como ocorreu em áreas
de floresta na Amazônia, em 1996), o projeto
diz simplesmente que não será necessário
nenhuma recuperação, e permite
que a comprovação da legalidade da ocupação
sejam com “descrição de fatos históricos
de ocupação da região, registros
de comercialização, dados agropecuários
da atividade”. Ou seja, com simples declarações
o proprietário poderá ver-se livre
da RL, sem ter que comprovar com
autorizações emitidas ou imagens de satélite
que a área efetivamente havia sido
legalmente desmatada.
13. DESMONTE DO SISTEMA DE CONTROLE DA
EXPLORAÇÃO DE FLORESTAS NATIVAS E TRANSPORTE
DE MADEIRA NO PAÍS. O texto do PL
aprovado permite manejo da reserva legal
para exploração florestal sem aprovação
de plano de manejo (que equivale ao
licenciamento obrigatório para áreas que
não estão em reserva legal), desmonta o
sistema de controle de origem de produtos
florestais (DOF – Documento de Origem
Florestal) ao permitir que vários sistemas
coexistam sem integração. A Câmara
rejeitou o parágrafo 5º do art. 36 do
Senado o que significa a dispensa de obrigação
de integração dos sistemas estaduais
com o sistema federal (DOF). Como
a competência por autorização para exploração
florestal é dos estados (no caso
de propriedades privadas rurais e unidades
de conservação estaduais) o gover-
Old Shoe Woman O
texto do PL aprovado permite manejo da
reserva legal para exploração florestal sem
aprovação de plano de manejo (que equivale ao
licenciamento obrigatório pra áreas que não
estão em reserva legal) e desmonta o sistema de
controle de origem de produtos florestais (DOF -
Documento de Origem Florestal)ao permitir que
vários sistemas coexistam sem integração.


André Lima – Advogado, mestre em Política e
Gestão Ambiental pela UnB, Assessor de Políticas
Públicas do Instituto de Pesquisa Ambiental
da Amazônia (IPAM), Consultor Jurídico da
Fundação SOS Mata Atlântica e sócio-fundador
do Instituto Democracia e Sustentabilidade,
Raul Valle – Advogado, mestre em Direito Econômico
pela Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo e Coordenador Adjunto do
Instituto Socioambiental. Tasso Azevedo – Eng.
Florestal, Consultor e Empreendedor Sociambiental,
Ex-Diretor Geral do Serviço Florestal
Brasileiro. Artigo publicado pelo IPAM (02/5/
2012) e pelo portal EcoDebate (07/05/2012).
no federal perde completamente
a governança sobre o
tráfico de madeira extraída
ilegalmente (inclusive dentro
de Unidades de conservação
federais e terras indígenas)
e de outros produtos
florestais no País. Essa lacuna
não é sanável pelo veto
presidencial.
Há ainda outros pontos problemáticos
no texto aprovado
confirmado pela Câmara cujo
veto é fundamental e que demonstram
a inconsistência do
texto legal, que se não for vetado
por completo resultará
numa colcha de retalhos.
A todos estes pontos se somam
os vícios de origem insanáveis
deste PL como é o
caso da definição injustificável
da data de 22 de julho de
2008 como marco zero para
consolidação e anistia de todas
irregularidades cometidas
contra o código florestal
em vigor desde 1965. Mesmo
que fosse levada em conta a
última alteração em regras de
proteção do código florestal,
esta data não poderia ser
posterior a 2001, isso sendo
muito generoso, pois a última
alteração em regras de
APP foi realizada em 1989.
POR ESSAS RAZÕES NÃO VEMOS ALTERNATIVA
SENSATA À PRESIDENTE DA REPÚBLICA
SE NÃO O VETO INTEGRAL AO
PL 1876/99. ■
“Pedimos à presidente Dilma o veto integral dos retrocessos

contidos no projeto de lei aprovado
pela Câmara, que reduz a proteção às florestas”, escrevem os

ex-ministros brasileiros do Meio
Ambiente, em apelo publicado no jornal Folha de S. Paulo.
Nós, do Fórum dos Ex-Ministros do Meio Ambiente do Brasil,

dirigimos um apelo público
à presidente da República a respeito do projeto de lei 1976/99,

aprovado pela Câmara dos
Deputados com alterações ao Código Florestal.
Reconhecemos e destacamos o compromisso da presidente Dilma,

assumido ainda quando
ela era candidata e reafirmado reiteradas vezes nos últimos meses

(inclusive durante uma audiência
com os representantes do Fórum de Ex-Ministros do Meio

Ambiente em maio de 2011), de
vetar qualquer alteração na legislação brasileira que represente

um aumento de desmatamento
ou a anistia daqueles que desmataram ilegalmente
Nós observamos também que esse compromisso, que é amplamente

apoiado pela opinião pública
brasileira, reflete os interesses maiores da nação, dos quais a

presidente é a fiel depositária.
O Comitê Nacional em Defesa das Florestas e do Desenvolvimento

Sustentável e diferentes
setores da academia, da sociedade civil e do setor produtivo têm

demonstrado enorme preocupação com
as consequências da sanção do projeto de lei aprovado pela

Câmara dos Deputados.
Todos pedem o veto integral dos retrocessos contidos no texto. Eles

reduzem drasticamente o status
de proteção das florestas no Brasil, bem como a governança

socioambiental construída nas últimas
décadas. Mais de 2 milhões de pessoas se manifestaram através de

abaixo-assinado nesse sentido.
Em nome do fórum de ex-ministros, solicitamos que a presidente,

em coerência com o seu compromisso
e com os anseios da sociedade, vete integralmente toda e qualquer

norma de caráter
permanente ou transitório que:
Ï% Sinalize ao país a possibilidade presente e futura de anistia;
Ï% Permita a impunidade em relação ao desmatamento;
Ï% Descaracterize a definição de florestas, que está consagrada na

legislação vigente;
Ï%Reduza direta ou indiretamente a proteção do capital natural

associado às florestas;
Ï% Fragilize os serviços prestados por elas;
Ï% Dificulte, esvazie ou desestimule mecanismos para a

restauração;
Ï% Ou, ainda, fragilize a governança socioambiental.
Ao mesmo tempo, nós entendemos que continua necessário

construir um quadro de referência
normativo estratégico, alinhado com os desafios contemporâneos,

de modo a valorizar o conjunto
de nossas florestas.
Para tanto, a partir da experiência acumulada no serviço público

ao longo de tantos anos, assim
como da diversidade de seus membros, o fórum se coloca à

disposição para apoiar, da forma que
for julgada mais oportuna, a elaboração e tramitação no

Legislativo de uma proposta que vise
uma política florestal sustentável – e que, portanto, valorize as

funções de conservação, de recuperação
e de uso econômico do capital natural associado às nossas

florestas.
Os autores são os membros do Fórum de Ex-Ministros de Meio

Ambiente do Brasil:
Carlos Minc, 60, ministro entre 2008 e 2010 (governo Lula)
Marina Silva, 54, ministra entre 2003 e 2008 (Lula)
José Carlos Carvalho, 59, ministro em 2002 (FHC)
José Sarney Filho, 54, ministro de 1999 a 2002 (FHC)
Gustavo Krause, 65, ministro de 1995 a 1998 (FHC)
Henrique Brandão Cavalcanti, 83, ministro em 1994 (governo

Itamar Franco
Rubens Ricupero, 75, ministro entre 1993 e 1994 (governo Itamar)
Fernando Coutinho Jorge, 72, ministro entre 1992 e 1993

(governo Itamar)
José Goldemberg, 83, secretário do Meio Ambiente em 1992

(governo Collor)
Paulo Nogueira Neto, 90, foi secretário especial do Meio

Ambiente entre 1973 e 1985
(governos Médici, Geisel e Figueiredo)
Manifesto publicado originalmente na Folha de S. Paulo.(22 /05

/2012) e reproduzido em www.-
ihu.unisinos.br/noticias/509724-apelo-publico-dos-ex-ministros,

entre outros sites.
APELO PÚBLICO DOS EX-MINISTROS
PELO VETO INTEGRAL DO CÓDIGO FLORESTAL
Cidadania&MeioAmbiente 33
34
Apesca no mundo está chegando ao limite e a
tendência, segundo os especialistas, é de que,
sem controle da produção e do consumo, o cenário
fique cada vez pior. Segundo um relatório publicado
na semana passada pelo Fundo das Nações Unidas
para Agricultura e Alimentação (FAO, na sigla
em inglês), 30% dos peixes do mundo são superexplorados
(e podem desaparecer) e outros 57% estão
próximos do limite de extração sustentável.
No Brasil, a situação é bem parecida. “A tendência
é acreditar na fartura dos estoques e achar
que se pode pescar no Brasil como se os recursos
nunca fossem acabar. Precisamos racionalizar
a pesca e o consumo porque a situação
está entrando em colapso”, alerta o biólogo e
especialista em políticas públicas para o meio
ambiente Tom Grando.
Esse esgotamento das reservas, segundo Antonio
Ostrensky, coordenador do Grupo Integrado
de Aquicultura e Estudos Ambientais da Universidade
Federal do Paraná (UFPR), se deve a
um conjunto de fatores, mas principalmente à
própria atividade pesqueira.
Com equipamentos mais eficientes e cada vez
mais gente vivendo da atividade, os pescadores
apanham espécies menores ou peixes muito novos,
que ainda nem se reproduziram, não dando
tempo para que os estoques sejam repostos. Assim,
o número de peixes diminui. “No Brasil,
temos uma produção que, em números, está estável
e até cresceu em volume, em comparação
com a década passada, mas pegamos peixes cada
vez menores e mais baratos”, revela Ostrensky.
Nos mares, a grande vilã é a pesca industrial descontrolada.
“Na pesca do atum, é comum o barco
pegar tubarões, golfinhos e tartarugas. Além disso,
basta observar os barcos que passam redes
pelo fundo do mar para pegar camarão. Eles
arrebentam todos os ecossistemas e matam pequenos
peixes que ficam agarrados às redes”,
diz Ostrensky. Nos rios, o impacto também é
causado pela alteração dos ambientes, principalmente
devido à instalação de usinas hidrelétricas.
E C O S S I S T E M A M A R I N H O
por Rafaela Bortolin
Os estoques de
peixe estão no limite
e os especialistas
culpam a extração
descontrolada.
para se alimentar porque a pecuária cobriu essa
lacuna, sustenta a produção de carne e comprar
um bife se tornou muito mais barato do que caçar.
Em médio e longo prazo, a pesca vai cair
nessa dinâmica e vamos passar a consumir cada
vez mais os produtos da aquicultura.”
O biólogo Tom Grando esclarece que, assim como
qualquer atividade humana, a aquicultura gera impactos
ambientais, principalmente no uso de recursos
hídricos e produção de rações, mas o esforço
vale a pena. “O impacto não é maior ou menor
que o da pesca, mas tende a ser uma forma de
minimizar os problemas [da superexploração].”
O professor explica que uma tendência que precisa
ganhar força é a da aquicultura como forma
de promover o repovoamento de rios e mares.
“No Japão, há um investimento nessa área e os
resultados são interessantes, porque aumentam
a produção pesqueira e contribuem para a manutenção
dos ecossistemas.”
IMPACTOS SÃO AMBIENTAIS E ECONÔMICOS
Os especialistas são unânimes: o progressivo esgotamento
das reservas de peixes provoca uma série
de impactos ambientais preocupantes. “A natureza
funciona em um equilíbrio próprio: se você acaba
com uma espécie de peixe, mexe com toda a cadeia
alimentar e há um colapso nas outras populações,
que podem se reproduzir descontroladamente ou
entrar em extinção também. Do urso ao plâncton,
passando pelos seres humanos, todos são afetados”,
explica o biólogo Tom Grando.
Há também os efeitos econômicos para as populações
que vivem às margens de rios e mares.
“Por acabarem os estoques que têm maior valor
comercial, vão diminuindo os ganhos com a
pesca, o setor empobrece e essa fonte de renda
deixa de ser viável para as populações ribeirinhas”,
sinaliza Grando. ■
Rafaela Bortolin – Texto publicado pela Gazeta
do Povo, (21/07/2012) e republicado no portal
EcoDebate (23/07/2012).
30% das populações de peixes...
ameaçadas de extinção
INCENTIVO
Em 2009, o Brasil criou o Ministério da Pesca e
Aquicultura (MPA), como forma de incentivar o
consumo de peixes. Para o biólogo, a medida é
“um tiro no escuro”, porque o Brasil não tem um
monitoramento eficiente dos volumes que são retirados
de rios e mares. “Sem saber quanto temos e
quanto tiramos, fica difícil estabelecer os limites.”
Para evitar a extinção das reservas brasileiras, o
segredo seria investir na longevidade dos estoques
e evitar o desperdício, o que exigiria um comportamento
menos extravagante tanto na pesca
quanto no consumo. “Comemos de forma perdulária
e matamos muito mais peixes que o necessário.
Sabe-se que 10 kg de peixes são desperdiçados
para conseguir um quilo de camarão.”
MEDIDAS
Segundo Mutsuo Asano Filho, diretor do Departamento
de Planejamento e Ordenamento da
Pesca Industrial do MPA, a alternativa para reduzir
o desperdício e ampliar o aproveitamento
é investir em recursos pesqueiros que ainda não
foram explorados por aqui e espécies que vivem
em grandes profundidades.
ESPÉCIES AMEAÇADAS
No Brasil, as espécies que mais representam a
superexploração dos estoques são os meros e as
garoupas, que já contam com projetos de proteção
na costa brasileira. No litoral do Paraná é
comum os pescadores das baías de Guaratuba e
Paranaguá pescarem um volume menor que em
anos anteriores e, no interior, é cada vez mais
raro ver dourados, pintados, piaparas e
piraputangas, espécies típicas do Rio Paraná.
“No Rio Tibagi, esses peixes já sumiram”, explica
o biólogo Tom Grando.
AQUICULTURA:
SOLUÇÃO PARA MANTER RESERVAS
Uma das soluções para controlar a superexploração
dos estoques pesqueiros, segundo o professor
da UFPR Antonio Ostrensky, é o investimento
na aquicultura – criação de organismos aquáticos
em cativeiro. “Hoje ninguém mais caça
Wellington Pedro
 

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